Violência Doméstica Contra Mulheres e a Relação Possível com Indicadores Econômicos e Sociais

Autor: Janael da Silva Alves

Mini-Bio: Graduado em Geografia, mestre em Gestão Pública e Sociedade, especialista nas áreas de Gestão em Segurança Pública, Planejamento e Gestão de Trânsito, Direito Administrativo e Educação em Direitos Humanos. Sargento na Polícia Militar de Minas Gerais.

Titulação: Mestrado

País: Brasil

Estado: Minas Gerais

Cidade: Varginha

E-mail de contato: janael10@yahoo.com.br

ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1766-8600

Resumo

Os crimes de violência doméstica contra a mulher são caracterizados como aqueles que acontecem no âmbito das relações familiares, esta modalidade criminosa veio a ser considerada uma política pública a partir do ano de 2006 com a edição da lei nominada “Maria da Penha” quando os crimes de violência doméstica passaram a ser monitorados com maior acuidade pelos governos e órgãos de segurança pública. Por meio deste trabalho, vai-se realizar uma análise descritivo comparativa dos registros de crimes de violência doméstica contra a mulher ocorridos no ano de 2018 nas regiões Sul e Norte do Estado de Minas Gerais, buscando a possível relação entre os indicadores sócio econômicos destas regiões e os registros de violência doméstica. O trabalho foi desenvolvido utilizando-se de fontes de dados oficiais divulgados por meio de sites do governo de Minas Gerais. Descobriu-se a existência de uma correlação entre indicadores econômico sociais favoráveis e o alto número de registros de ocorrências de violência doméstica.

Palavras-Chave: Violência doméstica; Violência Intrafamiliar; Segurança Pública; Sul de Minas Gerais

Domestic Violence Against Women and the Possible Relationship with Economic and Social Indicators

Abstract

The crimes of domestic violence against women are characterized as those that occur in the context of family relations, this criminal mode came to be considered a public policy from the year 2006 with the edition of the law named "Maria da Penha" when crimes of domestic violence began to be monitored more closely by governments and public security agencies. Through this work a comparative descriptive analysis of the records of crimes against domestic violence against women occurred in 2018 in the South and North of the State of Minas Gerais will be carried out, seeking a possible relation between the socioeconomic indicators of these regions and the records of domestic violence. The work was developed using official data sources published through Minas Gerais government websites. It was found that there is a correlation between favorable social economic indicators and the high number of records of occurrences of domestic violence.

Keywords: Domestic violence; Intrafamily violence; Public security; South of Minas Gerais

DOI: https://doi.org/10.31060/rbsp.2021.v15.n1.1182

Data de recebimento: 07/07/2019

Data de aprovação: 10/07/2020

INTRODUÇÃO

O presente artigo apresentará os números de registros de violência doméstica contra as mulheres nas regiões Sul e Norte do Estado de Minas Gerais e fará uma análise comparativa entre estas duas regiões. A região Sul apresenta indicadores sócio econômicos dentre os mais positivos do Estado, ao contrário, a região Norte de Minas Gerais apresenta indicadores dentre os mais desfavoráveis. Será realizada uma análise comparativa entre as regiões mencionadas buscando ainda uma possível correlação entre a modalidade criminosa da violência doméstica contra a mulher e os indicadores sócio econômicos destas regiões do Estado de Minas Gerais e verificar, se pelos registros oficiais que são divulgados por meio de órgãos de segurança pública é possível apontar a existência da correlação entre as condições sócio econômicas dos indivíduos e os crimes de violência doméstica.

A lei considera o crime de violência doméstica e familiar contra a mulher como sendo "qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial". (SENADO FEDERAL, 2011. p.16 )

Ressalta-se a existência de uma alta taxa de subnotificação de crimes, que conforme MacDonald (2002) é uma variável importante a ser considerada na análise criminal e ainda Madalozzo (2011), que destaca em seu trabalho a pesquisa do Instituto Futuro Brasil, esta revela por exemplo, no caso da cidade de São Paulo um índice de subnotificação de 68% dos crimes. Este é um fator de limitação nos estudos de análise criminal, sendo assim, o presente trabalho irá utilizar os dados e estatísticas disponíveis pelos canais oficiais do governo, considerando para o presente estudo os crimes de violência doméstica que foram notificados e registrados pelos órgãos de segurança pública do Estado de Minas Gerais.

METODOLOGIA

O trabalho trata-se de uma pesquisa exploratória de abordagem quantitativa a partir de fontes secundárias que descreverá o fenômeno da violência doméstica em duas regiões de planejamento do Estado de Minas Gerais. O Estado para fins de administração e planeamento nas mais diversas áreas é dividido em 17 regiões conforme Minas Gerais (2019), já para fins de coordenação e controle especificamente na área da segurança pública, o Estado é dividido em 19 Regiões Integradas de Segurança Pública (RISPs).

O trabalho se propõe fazer uma fazer uma abordagem descritiva geral e uma análise comparativa dos macro dados estatísticos sócio econômicos das regiões Norte e Sul de Minas Gerais na busca de uma possível relação com os dados de registro de violência doméstica contra a mulher nestas mesmas regiões. Os dados da violência doméstica foram obtidos a partir do relatório: “Diagnóstico de Violência Doméstica e Familiar nas Regiões Integradas de Segurança Pública de Minas Gerais”, referente ao ano 2018 publicados pelo governo do Estado e os dados sócio econômicos foram obtidos no portal governamental Minas em Números.

Os números de registros de violência doméstica contra as mulheres divulgados no Diagnóstico são oriundos do denominado Armazém de Dados do Sistema Integrado de Defesa Social (SIDS)/ Registro de Eventos de Defesa Social (REDS), que são os registros das ocorrências realizados pelos órgãos de segurança pública do Estado de Minas Gerais, já os dados utilizados referentes aos indicadores sócio econômicos das regiões de planejamento são oriundos do portal Minas em Números que tem por base as seguintes fontes: IBGE (2010), PNUD (2010), INEP Censo Escolar (2017), DATASUS (2017), FEAM-MG (2015), SEF-MG (2016), CAGED-MTE (2017) e Secretaria de Estado de Segurança Púbica da MG SESP (2018).

As 19 RISPs estão delimitadas territorialmente dentro das regiões administrativas de Minas Gerais, mas não guardam uma uniformidade com estas, e por este motivo, ao buscar se comparar os dados referentes à segurança pública das RISPs e outros dados em âmbito regional depara-se com algumas limitações no que diz respeito ao recorte. No caso da região de planejamento Sul de Minas, as RISPs que se distribuem em seu território são a 6ª RISP Lavras, a 17ª RISP Pouso Alegre e a 18ª RISP Poços de Caldas, já a região Norte de Minas tem em seu espaço territorial a presença da 11ª RISP Montes Claros.

Na Região Sul, o número de municípios congregados pelas três RISPs citadas anteriormente ultrapassa o número dos municípios da região de planejamento, portanto optou-se por retirar os números de registro de violência doméstica referentes ao município de Passos/MG integrante da 18ª RISP-Poços de Caldas, uma vez que em relação às regiões de planejamento, o município de Passos/MG pertence à região denominada Sudoeste de Minas. Por meio deste recorte, será possível uma maior aproximação da representação da realidade dos registros de ocorrências das RISPs em adaptação à abrangência regional da região Sul. Já a região Norte de Minas e a 11ª RISP guardam uma quase total uniformidade no número de municípios abrangidos.

No corpo do trabalho, será calculada e definida a taxa de crimes de violência doméstica contra as mulheres na proporção de Violência Doméstica por 100 mil habitantes, o que possibilitará a análise e a correlação com os outros indicadores de cada uma das regiões de planejamento objetos de investigação deste trabalho, e a posterior comparação entre as regiões.

3– REFERENCIAL TEÓRICO

Violência conforme Zaluar (1999) pode ser entendida etimológica, conceitual e de forma aplicada como a prática de um ato de exercício de força para exercer a perturbação, assim como o crime, a violência também pode variar histórica e culturalmente. Conforme o autor, o termo,

[...] vem do latim violentia que remete a vis (força, vigor, emprego de força física ou os recursos do corpo para exercer sua força vital). Essa força torna-se violência quando ultrapassa um limite ou perturba acordos tácitos e regras que ordenam relações, adquirindo carga negativa ou maléfica. É, portanto, a percepção do limite e da perturbação (e do sofrimento que provoca) que vai caracterizar o ato como violento, percepção essa que varia cultural e historicamente. (ZALUAR 1999, p. 8)

A violência doméstica contra a mulher é considerada conforme CERQUEIRA et All (2015. p.9), como sendo a “mãe de todas as violências”.

A lei tipifica a violência doméstica contra a mulher como qualquer ato de “ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: e define doméstico como sendo o “espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas”. (SENADO FEDERAL, 2011. p.16).

Condições precárias de renda, acesso a saúde, à educação, acesso ao emprego não apenas são deflagradores de atos violentos nas mais diversas dimensões, mas também contribuem para agravamento destes mesmos problemas que origina, e em alguns estudos como em De Alcântara et al (2018), em um município do Nordeste as condições precárias estão presentes no perfil das vítimas de violência doméstica. No estudo de Ribeiro e Sanches (2005), foi apurado que as mulheres vitimadas ganham em média 44% dos rendimentos médios em relação às mulheres não vitimadas apontando para uma relação entre renda e violência doméstica.

Trabalho de Martins (2017) apontou uma correlação entre o menor nível de escolaridade e a vitimização doméstica das mulheres, a autora ainda encontrou na análise que:

“a vitimização por violência doméstica a partir da cor, as mulheres pardas e pretas totalizam mais de 60% das vítimas, o que se assemelha às demais formas de crime, principalmente furtos e roubos. A predominância da violência sobre mulheres não brancas pode ser dada por uma maior vulnerabilidade destas, já que no Brasil as mulheres brancas são mais escolarizadas e possuem maior nível de renda”. (MARTINS, 2017. p.34)

Martins (2017) afirma que pelos resultados obtidos em seus estudos, é possível constatar que as mulheres vitimadas possuem menor escolaridade e consequentemente auferem renda média mais baixa, fazendo a correlação entre baixo nível de escolaridade, desemprego, baixa renda demostrando uma associação entre renda per capita baixa e a ocorrência de vitimização por violência doméstica.

Dias (2017) buscou problematizar a relação entre a exclusão social e a violência doméstica, a autora cita alguns fatores que estão presentes tanto nos grupos que sofre com a exclusão social quanto na vida dos atores envolvidos em violência doméstica, citando: habitação deficitária, condições de saúde precárias, baixo nível de escolaridade, desemprego e precariedade do trabalho, baixos rendimentos, ausência de equipamentos coletivos, dentre outros.

Para De Lucena et all (2017), a violência doméstica é compreendida como sinônimo de violência contra a mulher, o que o determina como sendo um fenômeno de múltiplas determinações. Para Bandeira (2014), os atos de violência doméstica contra a mulher trazem como pano de fundo motivações referentes “à hierarquia de poder, desejos de dominação e aniquilamento do outro e que pode ser utilizada algumas vezes, conscientemente, nas relações conjugais como mecanismo para subordinação da mulher ao parceiro”

Estudo de De Lucena et al (2017) com 427 mulheres que buscou por meio de uma análise regressiva a relação de dependência entre a qualidade de vida e a violência doméstica, mostrou que, quanto maior a avaliação da satisfação da qualidade de vida entre as mulheres, sua inserção em relações sociais e a sensação de segurança das mesmas, menor será a probabilidade de ocorrência de violência doméstica contra a mulher, compreendendo-se como qualidade de vida, o que é definido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) conforme o WHOQOL GROUP (1998) enquanto direito de cidadania, o que se refere à soma das condições econômicas, ambientais, científico-culturais e políticas coletivamente construídas e postas à disposição dos indivíduos para que estes possam realizar suas potencialidades. Segundo De Lucena et al (2017), a qualidade de vida é um fator de proteção contra a violência doméstica.

Na outra vertente, estudos que não encontram relação de dependência direta entre violência doméstica, baixa escolaridade e renda, está o trabalho de Moreira et all (2016) que não identificou o aumento de renda funcionando como um fator estanque para a violência, o autor pesquisando a respeito do tema, descobriu que mulheres jovens que passaram a receber o benefício do bolsa família possuíam maior probabilidade de se tornarem vítimas de violência doméstica.

Ribeiro e Sanches (2005) apud Martins (2017) apesar de identificar o fator baixa renda como mais presente entre as mulheres vitimadas ele chama a atenção para um fato relevante em seu trabalho ao ressaltarem que a violência doméstica ocorre em todos os níveis sociais, no entanto os registros de violência doméstica se dão em maior número entre mulheres com maior renda e escolaridade, uma vez que elas reúnem condições mais favoráveis para a denúncia por possuirem um menor grau de denpendência do agressor.

4 - APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS

Para entender a abrangência deste estudo da violência doméstica e a necessidade de entende-lo como um fenômeno que pode ser tratado em caráter regional apresenta-se aqui a 11ª RISP-Montes Claros que congrega 77 dos 86 municípios da região Norte do Estado de Minas Gerais, enquanto que as 6ª RISP-Lavras, 17ª-Pouso Alegre e 18ª RISP-Poços de Caldas congregam 171 municípios ante os 118 definidos como integrantes a região de planejamento Sul do Estado, ultrapassando portanto em 53 o número de municípios da região de planejamento. Destas três RISPs, toma-se aqui particularmente a 18ª RISP-Poços de Caldas, cuja a denominação da nomenclatura apresenta um município que está localizado na região Sul de Minas Gerais, mas é importante destacar que esta RISP abrange diversos municípios da região sudoeste do Estado, e após análise optou-se por excluir dos números finais da 18ª RISP, os registros de violência doméstica do município de Passos/MG que é maior município da região sudoeste e que sozinho representa segundo o IBGE (2010) quase 20% da população e índices relacionados à economia da região Sudoeste.

No quadro 1 é apresentado alguns indicadores sócio econômicos das regiões norte e sul do Estado de Minas Gerais.

Quadro 1 – Indicadores regionais Sul e Norte Minas Gerais

Região População Pobres Analfabetismo

Saneamento

Básico

PIB per capita R$ Taxa de desocupação
Norte 1.577,300 53,5% 16% 38,6% 13.857 9,05%
Sul 2.031.229 25,6% 7,3% 83,3% 27.407 5,31%

Fonte: Elaborado pelo autor com base em http://www.numeros.mg.gov.br

O quadro 2 a seguir apresenta os dados da violência doméstica nas regiões integradas de segurança pública que são abrangidas pelas regiões de planejamento norte e sul de Minas Gerais.

Quadro 2 – Quantitativo de registros de Crimes de Violência doméstica das Regiões Sul e Norte de Minas Gerais ano de 2018

Região Integrada de Segurança Pública Violência Doméstica 2018
6ª RISP – Lavras 6.400
17ª RISP – Pouso Alegre 5.704
18ª RISP – Poços de Caldas 7.908 – 881= 7.027
11ª RISP – Montes Claros 8.518
Total de Registros de Violência Doméstica no Estado de Minas Gerais em 2018 144.957

Fonte: Diagnóstico de Violência Doméstica e Familiar nas Regiões Integradas de Segurança Pública de Minas Gerais (2019).

O quadro 2 apresentou os números de registros violência doméstica nas regiões Sul e Norte, além da totalidade de registros no estado de Minas Gerais em 2018.

Dos 144.957 registros de violência doméstica ocorridos em todo o estado de Minas Gerais no ano de 2018, os registros para esta mesma modalidade criminosa pelas RISPs que representam a região Sul somados foram 19.131, sendo 6.400 registos pela 6ª RISP –Lavras, 5.704 registros pela 17ª RISP – Pouso Alegre e 7.027 registros pela 18ª RISP-Poços de Caldas, com média de 6.377 crimes de violência doméstica por RISPs integrantes das regiões Sul.

Os dados obtidos por meio do portal governamental, Minas em Números (2019), que utiliza os dados do IBGE (2010) apresenta a região Sul como tendo 2.031.229 habitantes, integrada por 118 municípios e um percentual de 81,63% desta população vivendo em área urbana.

Já na região Norte a 11ª RISP registrou o número de 8.518 crimes de violência doméstica contra a mulher. Conforme o portal Minas em Números (2019) a região Norte possui 1.577.300 habitantes, é integrada por 86 municípios sendo que 69,49% da população vive na área urbana.

Considerando-se os números de registros absolutos de cada RISP em separado percebe-se que estes registros tanto na RISP da região Norte quanto nas da região Sul apresentam uma variação percentual de aproximadamente 33% entre a RISP com maior número de registros que é a 11ª na região Norte em relação a RISP que registrou o menor número de ocorrências de violência doméstica contra a mulher, que é a 17ª RISP-Pouso Alegre; também a 6ª e 18ª RISP apresentam números absolutos menores de registros do que a 11ª RISP. Os dados, quando apresentados em separado por RISPs levam a um entendimento de que a região Sul teria o menor número de registros de violência doméstica, se consideradas as RISPs descoladas do contexto regional das regiões de planejamento, no entanto a análise individual por RISP cria distorções e barreiras para a análise regional do fenômeno da violência doméstica contra a mulher.

Um primeiro exercício de análise advém do número dos crimes de violência doméstica dividido pela respectiva população das regiões estudadas realizando-se o cálculo para obtenção do número de crimes de violência doméstica por 100 mil habitantes em cada região. Para se alcançar o índice de violência doméstica contra as mulheres por 100 mil habitantes utilizou-se a seguinte fórmula:

FÓRMULA = Registros de Violência Doméstica = ∑ViolênciaDoméstica = ViolênciaDoméstica/População x 100.000

Após os cálculos obtém-se o seguinte: A região Norte apresenta uma taxa de 540 crimes de violência doméstica para cada 100 mil habitantes, enquanto que a região Sul possui uma taxa de 981 crimes de violência doméstica por 100 mil habitantes, demonstrando, de acordo com o que é registrado pelos órgãos de segurança pública que a taxa de crimes de violência doméstica nas regiões Sul de Minas é cerca de 81% maior do que na região Norte.

Tamanha diferença nos números de registros do crime de violência doméstica pode estar associada a fatores sócio econômicos, é o que se infere de Ribeiro e Sanches (2005), quando ele afirma que a renda e a escolaridade são dois indicadores sócio econômicos bastante relevantes quando se leva em conta os fatores de influência nas denúncias de violência doméstica as autoridades públicas e que, portanto, podem apresentar uma possível correlação direta com o número de registros. Segundo Ribeiro e Sanches (2005), pessoas mais escolarizadas e com maior renda possuem um melhor esclarecimento e menores custos associados para realizarem as denúncias, de acordo com estes autores em regiões onde os indicadores renda e escolaridade sejam maiores acontece um aumento no número de registros e denúncias aos órgãos de segurança diante da ocorrência de crimes de violência doméstica; esta conclusão pode ser facilmente tomada a partir da comparação entre os quadros 1 e 2 apresentados anteriormente.

A diferença muito relevante no número de registros que aponta o índice da violência doméstica como sendo 81% maior na região sul do estado em relação à região norte, pode ser associada também ao nível de analfabetismo das regiões; conforme o portal Minas em Números (2019) a região Sul possui a 6ª menor taxa de analfabetismo do estado de Minas Gerais, já a região Norte ao contrário dentre as 17 regiões é a 3ª com maior número de pessoas analfabetas no estado. Estes dados assim como os de desempregados demonstram uma grande discrepância da região Sul em relação à região Norte, enquanto a região Sul apresenta uma média de desocupação de 4,77% de sua população, a região Norte apresenta 9,05% de desocupação de sua força de trabalho, fatores assim, conforme Ribeiro e Sanches (2005) são indicadores sócio econômicos que influenciam nas denúncias por parte das vítimas em relação ao crime de violência doméstica.

PIBperCapita é o indicador que mostra a riqueza total de uma região dividida pelo número de moradores, tendo a região Sul o 5ª maior PIB per capita do Estado enquanto a região Norte aparece apenas a 14ª posição dentre as 17 regiões de Minas Gerais, ao se observar este indicador os dados apresentados demonstram uma relação direta entre um PIBperCapita alto e o alto número de registros de violência doméstica. Na região Sul de Minas Gerais o PIBperCapita é cerca de 81% maior do que da Região Norte demonstrando um percentual semelhante ao número dos registros de crime de violência doméstica na região Sul em relação à região Norte que também é de 81%.

Conforme Ribeiro e Sanches (2005) , as vítimas de violência doméstica que tenham uma menor dependência do agressor possuem uma maior capacidade de denunciar o crime. O que coincide com os dados da violência doméstica registrados e apresentados pelas RISPS em relação aos indicadores sócio econômicos das regiões de planeamento investigadas.

O Sul de Minas apresenta a 3ª menor taxa de desemprego do Estado, a região Norte por outro lado apresenta a 2ª maior taxa de desemprego, ocupando a 16ª posição no ranking das 17 regiões, estes dados do desemprego possuem uma aproximação com outro indicador que a taxa de pessoas consideradas pobres, conforme a classificação adotada pelo governo no site Minas em Números (Minas Gerais, 2019), onde tem-se como pobre, quem recebe menos que meio salário mínimo sendo que os indicadores apresentam a região Sul de Minas Gerais na 6ª colocação dentre as menores taxas de pobreza no Estado, enquanto que a região Norte de acordo com a classificação adotada pelo portal governo, é a segunda região que concentra o maior número de pessoas pobres do Estado, do que se infere ao se comparar estas duas regiões com seus indicadores sócio econômicos e registros de violência doméstica que existe uma relação de dependência direta entre as denúncias e os indicadores mais positivos.

6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A região Sul de Minas, como área administrativa para a gestão da segurança pública é coberta espacialmente, não hermeticamente pela 6ª, a 17ª e a 18ª (RISP), já a região Norte de Minas tem em seu espaço geográfico a 11ª RISP que abrange quase todos os municípios da região.

Apesar das dificuldades para se elaborar o método e o recorte deste estudo, principalmente devido às diferenças entre regiões adotadas pelo Estado para se definir os indicadores sócio econômicos e as regiões integradas para tratar e divulgar os números da segurança pública, ainda sim, foi possível por meio de uma análise comparativa entre as regiões e a correlação entre a renda, a escolaridade, a pobreza, o PIB e a violência doméstica, se obter um resultado satisfatório ante o esforço realizado, quando se infere por meio do estudo que os registros de violência doméstica são realizados em maior número em regiões que tenham indicadores sócio econômicos mais favoráveis mostrando uma relação de dependência direta entre rendas maiores e maior quantidade de registros de ocorrência de violência doméstica..

As regiões de planejamento foram delimitadas pelo IBGE (2017) considerando-se características de similaridades locais nos mais diversos setores como econômico, sociais e históricos, chama-se a atenção, portanto, que seria de primeira ordem para o governo a aceitação da ocorrência da violência doméstica contra a mulher como um fenômeno de caráter regional, que acontece em localidades que guardam similaridades sócio/econômicas, o que poderia facilitar a visão e as tomadas de ação por parte do Estado.

A violência doméstica é uma modalidade criminosa que foi negligenciada ao longo da história ao ser praticada em uma sociedade patriarcal e machista que julgava como um direito do homem a agressão contra a mulher. A partir de 2006 com a edição de legislação específica, a preocupação em prevenir e punir especificamente os crimes de violência doméstica passa a ser política de governo e meta dentro dos órgãos de segurança pública.

A literatura e estudos empíricos ainda não pacificou a dinâmica da influência de fatores econômico sociais sobre a prática da violência doméstica, mas no que diz respeito, ao ato de se realizar a denúncia e o registro de tais crimes parece haver uma relação direta entre indicadores mais positivos e aumento nos números de registros conforme recorte adotado neste trabalho.

O presente trabalho demonstrou que os números de registro de violência doméstica, comparando-se uma região com indicadores mais positivos e outra com outros menos positivos apresentam uma relação diretamente proporcional no que se refere aos registros oficiais de ocorrências desta natureza, necessitando-se, no entanto, de um trabalho empírico para verificar a possibilidade de a realidade não oficial ser justamente o oposto.

A região do estado de Minas Gerais que apresenta os maiores índices de analfabetismo, pobreza e menor renda é a região que apresenta uma taxa expressivamente menor de registros de crimes de violência doméstica por 100 mil habitantes quando comparada com uma região que apresentam indicadores sócio econômicos mais favoráveis.

Vale ressaltar que o menor número de registros do crime de violência doméstica não representa necessariamente o baixo índice de ocorrência podendo representar uma subnotificação dos fatos aos órgãos de segurança pública em razão das particularidades.

Por meio dos dados apresentados e discutidos as contribuições deste estudo podem ser a de se constituir para além de uma base e direcionamento para outros estudos da mesma natureza, colaborar igualmente para chamada de atenção do governo na adoção de políticas públicas, na abordagem e no tratamento da violência doméstica como fenômeno regional imbricado com outras variáveis, indicadores e particularidades e não apenas pelo viés e divisão hermética da segurança pública, podendo-se a partir de estudos empíricos identificar e delinear melhor o problema.

Como sugestão para um trabalho futuro, propõe-se que os dados condensados e apresentados neste trabalho que foi realizado a partir da pesquisa e grupamento dos indicadores e dos crimes de violência doméstica possam futuramente serem tratados por meio de uma análise estatística regressiva multivariável ou ainda um estudo empírico que busque no campo a confrontação com os macro dados apresentados pelo governo.

7 – REFERÊNCIAS

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