Melhorando a qualidade do contato entre policiais e cidadãos: os treinamentos em “procedural justice”1.

Viviane de Oliveira Cubas

Pesquisadora do NEV-USP. Doutora e Mestre em Sociologia pela Universidade de São Paulo e Bacharel em Ciências Sociais pela mesma universidade. Atua principalmente nos seguintes temas: violência, polícia, segurança pública, segurança privada, direitos humanos.

País: Brasil Estado: São Paulo Cidade: São Paulo

Email: vocubas@gmail.com Orcid: https://orcid.org/ 0000-0002-2356-4445

Gabriel Funari

Atualmente é doutorando em Sociologia pela Universidade de Oxford, estudando milícias e grupos de extermínio em Belém do Pará. Foi pesquisador do NEV-USP. Mestre em Estudos Latino-americanos pela Universidade de Cambridge e Bacharel em Relações Internacionais pela American University.

País: Brasil Estado: São Paulo Cidade: São Paulo

Email: gfunari93@gmail.com Orcid: https://orcid.org/0000-0003-4815-3594

Contribuições dos autores:

Viviane de Oliveira Cubas- editoração, levantamento de informações sobre departamentos de polícias dos quatro casos e informações demográficas das quatro cidades estudadas.

Gabriel Funari- levantamento geral de onde foram realizados os treinamentos. Também estabeleceu contato com os quatro casos estudados e obteve e analisou os materiais primários usados nos treinamentos policiais. Elaboração do marco teórico e conclusões.

Resumo

Este artigo apresenta um levantamento sobre treinamentos em justiça procedimental (procedural justice) realizados por agências policiais. Esses treinamentos, fundamentados nos estudos pioneiros de Tom R. Tyler acerca da legitimidade, têm como objetivos aperfeiçoar os procedimentos dos policiais nos atendimentos à população, melhorar a qualidade da relação entre policiais e cidadãos e, consequentemente, aumentar a legitimidade das autoridades policiais. Por meio de documentos primários e secundários, identificamos os treinamentos já implementados e selecionamos quatro deles para analisarmos mais detalhadamente. A análise mostrou como diferentes polícias, que apresentam diferentes históricos e atuam em contextos sociais bastante distintos, apropriam-se dos conceitos de justiça procedimental no intuito de intervir tanto em problemas estruturais quanto em questões mais pontuais do policiamento.

Palavras-chave:

Policiamento, treinamento policial, legitimidade policial, justiça procedimental

Improving the quality of interactions between police and citizens: the procedural justice training programs

Abstract

This article presents a review of existing procedural justice training programs conducted by police departments around the world. These programs originate out of Tom R. Tyler’s pioneering studies into police legitimacy. Procedural justice training focuses on improving police procedures when it comes to interacting with the population at large as a means to enhance police legitimacy. We review primary and secondary documents to map out the locations where police have implemented procedural justice training. We then select four case studies for a more detailed review on the structure and impact of the respective programs. We argue that despite being implemented in distinct social and historical contexts, the four case studies evince that police departments are able to appropriate the concepts surrounding procedural justice to intervene in internal structural issues within the police department and to improve relations with the population.

Key words:

Policing, police training, procedural justice, police legitimacy

Data de Recebimento: 15/05/2020 Data de Aprovação: 21/07/2021

DOI: 10.31060/rbsp.2022.v16.n2.1313

Introdução

Agências policiais de diversos países investem em treinamentos em justiça procedimental2 para seus membros, objetivando melhorar a qualidade da relação entre policiais e cidadãos e consequentemente aumentar a legitimidade das agências policiais. Desde 2012, unidades policiais nos EUA, no Reino Unido, no Canadá, na Austrália e no México oferecem treinamentos baseados na teoria da justiça procedimental (TJP) a policiais que atuam em contato direto com a população.

Os treinamentos se originaram na constatação de que a legitimidade das agências policiais junto aos cidadãos estava diminuindo (TYLER, 2017). Estudos empíricos apontam que o contato entre policiais e cidadãos representa um momento crucial no modo como os cidadãos avaliam a polícia, sobretudo na disposição das pessoas para confiar e/ou colaborar com a polícia (ROSENBAUM; LAWRENCE, 2017; SKOGAN, 2006b). Isso ocorre porque é nos contatos cotidianos com a população que a polícia molda a percepção do público a respeito da legitimidade policial. De um lado, interações consideradas injustas pelo público tendem a reduzir a confiança na polícia e dificultar o cotidiano policial; de outro, interações consideradas justas tendem a gerar resultados opostos.

Segundo a TJP, a conduta de agentes públicos responsáveis por aplicar a lei exige exercícios constantes de legitimação perante a sociedade. O que mais importa na geração de legitimidade das agências policiais não é, necessariamente, a produção de resultados eficazes, mas sim a qualidade na tomada de decisões dos policiais e a qualidade do tratamento que dispensam em suas interações com os cidadãos, pois interações desse tipo podem gerar a percepção, por parte dos cidadãos, de que a polícia é imparcial e respeitosa (TYLER, 2004).

Nesse sentido, os treinamentos em justiça procedimental visam aperfeiçoar os procedimentos adotados pelos policiais nos momentos de contato com o público. Além do fato de os procedimentos adotados pelos policiais nas ruas se mostrarem muito relevantes para a imagem da polícia, eles também consistem num dos aspectos sobre os quais os comandos podem exercer maior controle. Está muito mais ao alcance dos gestores interferir no modo como seus policiais tratam as pessoas nas ruas do que garantir a produção de resultados na segurança, como, por exemplo, reduzir as ocorrências de um determinado tipo de crime. Assim, a TPJ favorece o trabalho da polícia, uma vez que orienta a avaliação de suas ações em termos de procedimentos e não de resultados.

No Brasil, pesquisas concernentes à justiça procedimental nas ações policiais ainda são raras. Contudo, enquetes realizadas com o público confirmam a ampla falta de confiança nas polícias como instituições justas e eficazes. Numa escala de um a quatro, a confiança de cidadãos da cidade de São Paulo na polícia girava em torno de 2,1 em três amostras realizadas em 2015, 2017 e 2018 (NEV/USP, 2018). Além disso, em geral, a população não sabe diferenciar as atribuições das duas forças policiais responsáveis pela segurança pública.

Essa confusão deriva do fato de a população ser atendida por duas instituições com estruturas organizacionais diferentes, uma civil e outra militar, que pouco interagem a fim de promover o policiamento e a segurança, muitas vezes travando disputas por recursos e reconhecimento. Como resultado, as ações dos agentes, tanto de uma como de outra polícia, impactam na percepção da população acerca de uma entidade geral a qual ela vê como ‘polícia’ (CUBAS, TEIXEIRA & OLIVEIRA, 2020). Além disso, a política de dissuasão e repressão – que historicamente define o policiamento brasileiro – alimenta a falta de confiança do público nas instituições policiais, as quais, por sua vez, ainda ignoram a importância dos procedimentos para sua atuação (ZANETIC et al., 2016).

Nesse sentido, realizamos aqui uma análise comparativa de treinamentos em justiça procedimental desenvolvidos por diferentes polícias. Comparar os contextos sociais em que os treinamentos se realizaram e analisar seu impacto na conduta dos policiais nos levaram a tentar entender se a justiça procedimental se mostra capaz de fomentar formas de policiamento legítimas.

O artigo está dividido em duas partes. Na primeira, apresentamos pontos cruciais da literatura relativa à aplicabilidade da justiça procedimental para a polícia. Na segunda, abordamos o levantamento de treinamentos em justiça procedimental, em especial os treinamentos das polícias de Chicago (EUA), Seattle (EUA), Manchester (UK) e Queensland (AU). Por fim, discutimos os resultados alcançados pelos treinamentos.

A Teoria da Justiça Procedimental

A TJP se origina na psicologia comportamental e visa delinear as condições ideais nas quais uma autoridade possa ser obedecida consensualmente. Para Tyler e Degoey, “A legitimidade de uma autoridade se refere às crenças de que essa autoridade é o tomador de decisão apropriado e deve ter poder discricionário para tomar decisões para uma comunidade” (TYLER; DEGOEY, 1995, p. 482-483, tradução nossa).

A Legitimidade consiste numa qualidade de que certa autoridade, lei ou instituição pode dispor no intuito de induzir nos outros o sentimento de obediência às suas decisões e ordens. Internalizado esse compromisso com a obediência, há uma tendência ao maior autocontrole e senso de obrigação perante a autoridade e os pares, aumentando as chances de se portar conforme a legalidade, uma vez que a não violação da lei não se dá pela certeza de punição, mas sim pela imoralidade que tal ato representa. Logo, esse modo de pensar a motivação para a obediência rompe com a tradicional tese de que o respeito às leis e às autoridades se processaria pelo uso da coerção e pela perspectiva da punição (TYLER, 1988; MACCOUN, 2005).

A TJP está cada vez mais instrumentalizada e seus estudos empíricos visam identificar as motivações que levam as pessoas a deferir decisões e regras de instituições e princípios democráticos e a considerá-los legítimos. Os resultados demonstram que o processamento da percepção da legitimidade por parte dos cidadãos em relação às autoridades legais recai sobretudo nos procedimentos utilizados por essas autoridades no exercício de suas funções (LOWREY-KINBERG, 2019; TYLER, 2017; MAZEROLLE et al., 2013).

A justiça procedimental atinge a essência do policiamento. De acordo com Tyler (2004), para avaliar o quanto os procedimentos adotados pela autoridade se mostram ou não adequados, as pessoas levam em consideração quatro aspectos: primeiro, quando acionam a polícia, as pessoas precisam sentir que suas preocupações são levadas em consideração pelos policiais e que elas podem expressar seus pontos de vista (voz); segundo, querem que as decisões adotadas pela polícia sejam justas e imparciais, resultando numa análise objetiva e sem interferências pessoais (equidade); terceiro, querem ser tratadas com respeito e dignidade (polidez); quarto, como a população não tem conhecimento técnico da atividade policial, quer receber explicação dos policiais a respeito das atitudes e dos procedimentos deles de forma clara e precisa (justificativa).

Se os procedimentos adotados pela autoridade são considerados justos, há maiores chances de ela ser percebida como legítima pelo público e de estes autorizarem a autoridade a determinar que comportamento devem ter dentro de uma série de situações. As pessoas sentem que devem seguir as diretrizes de uma autoridade legítima mesmo quando as decisões dessa autoridade não são as mais desejáveis ou favoráveis para elas (TYLER, 2017). Além de gerar a ‘obediência voluntária’, a justiça procedimental pode dispor da capacidade de facilitar a cooperação do público com a polícia. Enquetes com pessoas que interagiram com policiais em vários contextos indicam que o público se mostra mais propenso a acionar a polícia e a ajudar os policiais se vir a polícia como uma instituição comprometida a atuar dentro dos procedimentos considerados justos (TYLER, 2017; NEV/USP, 2018).

A TJP problematiza que, assim como a justiça procedimental representa um elemento-chave para se entender a percepção do público acerca de suas autoridades, ela é também fundamental para entender a autolegitimidade dessas autoridades (self-legitimacy). A autolegitimidade significa a percepção que uma autoridade tem dela mesma, o nível de confiança que tem de sua própria legitimidade, de se sentir digna ou não de ocupar a posição que ocupa (TANKEBE, 2014). Pesquisas mostram que a autolegitimidade de policiais está fortemente relacionada aos procedimentos adotados dentro das instituições policiais. Aspectos como voz, equidade, polidez e justificativa se apresentam como importantes para entender a qualidade do tratamento que os policiais recebem de suas instituições e como isso impacta na construção de suas identidades e na qualidade da interação que estabelecerão no atendimento ao público (TANKEBE, 2014; 2019; TANKEBE; MESKO, 2015; NIX, 2017).

A qualidade do tratamento dispensado pelas chefias se mostra um poderoso elemento para a autolegitimidade. Relações fortemente hierarquizadas, abusivas ou consideradas injustas dentro de agências policiais influenciam negativamente no tratamento concedido ao público, assim como minam a confiança dos policiais em seu próprio trabalho (TYLER, 2017). Já policiais que relatam vivenciar relações pautadas pelos aspectos da justiça procedimental dentro de suas agências tendem a apresentar maior autolegitimidade, maior comprometimento com as diretrizes de suas agências, menor apoio ao uso da força e maior apoio ao policiamento fundamentado na justiça procedimental (BRADFORD; QUINTON, 2014; TANKEBE, 2014).

Os treinamentos em justiça procedimental

Foram identificadas cinquenta e cinco agências policiais, em cinco países, que já desenvolveram treinamentos baseados na TJP3.

O primeiro treinamento foi desenvolvido em Chicago (EUA), em 2012. A partir de 2014, os treinamentos proliferaram após vários casos de homicídios de jovens negros, como Michael Brown (em Ferguson) e Eric Garner (em Nova Iorque), cometidos por policiais (VITALE, 2017) e que repercutiram no país, geraram manifestações contra a truculência da polícia e ampliaram a visibilidade de movimentos como o Black Lives Matter (LA VIGNE et al., 2019). O comitê sobre policiamento, criado pelo presidente Barack Obama (2009-2016) após esses episódios, recomendou a adoção dos princípios de justiça procedimental nos programas de treinamento de todas as polícias do país (PRESIDENT’S TASK FORCE ON 21st CENTURY POLICING, 2015). Como resultado, treinamentos de justiça procedimental deixaram de ser projetos esporádicos e ganharam força como uma política pública voltada para os problemas de baixa legitimidade da polícia.

Depois dos EUA, em 2013, polícias no Reino Unido e na Austrália lançaram estudos exploratórios. A partir de 2014, polícias do Canadá e da Cidade do México começaram a implementar programas de treinamento baseados na TJP.

Das agências policiais que implementaram treinamentos baseados na TJP, as delegacias municipais e distritais dos EUA representam a grande maioria, com um total de quarenta e nove unidades policiais. Além disso, vinte universidades norte-americanas utilizaram métodos da TJP para treinar policiais responsáveis pela segurança em seus campi4.

Quadro 1 – Agências policiais e treinamentos em justiça procedimental por país

País Nome do treinamento Cidade/Unidade Policial Duração / Instrutores
EUA Quality Interaction Training Programme5 Chicago, Oakland, Salinas, Stockton, Louisville 8 horas-aula / policiais da ativa das próprias polícias
National Initiative for Building Community Trust and Justice6 Fort Worth, Gary, Birmingham, Minneapolis, Pittsburgh, Stockton 24 horas-aula dividas em três dias / policiais da ativa das próprias polícias
Fair and Impartial Policing7 Albuquerque, Athens-Clarke County, Baltimore, Bay Area Rapid Transit. Berkeley, Chapel Hill, Charleston, Clearwater, Concord, Detroit, Durham, Elgin, Fayetteville, Greensboro, Greenville, Henrico County, Kalamazoo, La Crosse, Las Vegas, Madison, Milwaukee, Minneapolis, New York, Norwalk, Palo Alto, Palm Beach County, Piedmont, William County, Richmond (VA), Richmond (FL), Sanford, San Francisco, St. Louis County, Tampa, Tucson, Virginia Beach, Wichita 8 horas-aula / instrutores da empresa, todos ex-policiais
LEED Procedural Justice Model8 Seattle Reunião de 20-30 minutos / comandantes policiais da unidade
Canadá Fair and Impartial Policing9 Vancouver, Ottawa 8 horas-aula / instrutores da empresa, todos ex-policiais
Reino Unido Greater Manchester Procedural Justice Training10 Manchester 14 horas-aula / instrutores da academia de polícia
Scottish Police and Citizen Engagement Program (SPACE)11 Glasgow 8 horas-aula / instrutores da academia de polícia
Austrália Voice4Values Província de Queensland 2-3 horas-aula / instrutores da academia de polícia
Queensland Procedural Justice Training Programme 8 semanas de treinamento / instrutores da academia de polícia
México Interacciones Productivas con Ciudadanos: Principios de Actuación12 Cidade do México 8 horas-aula /pesquisador da Universidade de Yale e policiais da ativa da própria polícia

Fonte: Elaborado pelos autores.

Desses treinamentos, quinze tinham sido submetidos a algum tipo de avaliação13. Nos EUA, as unidades policiais de Chicago, Seattle, Louisville e Oakland divulgaram resultados do impacto do treinamento no trabalho policial. Entre os policiais de Oakland, 98% deles avaliaram o treinamento como ‘excelente’ ou ‘muito bom’ (LA VIGNE et al., 2019). Pesquisas do treinamento em Louisville confirmaram que policiais com mais de vinte anos no trabalho e policiais mulheres foram quem mais valorizaram os conceitos da TJP (LA VIGNE et al., 2019).

Outras seis cidades, todas com características de diversidade racial, densidade populacional e altos índices de rejeição da polícia – Birmingham, Pittsburgh, Stockton, Gary, Fort Worth e Minneapolis – fizeram parte do programa piloto de justiça procedimental implementado pelo Ministério de Justiça (US Department of Justice, DOJ; LA VIGNE et al., 2019). Entre 2014 e final de 2018, todos os policiais das seis cidades receberam treinamento. Pesquisas com moradores das seis cidades indicaram que a percepção de tratamento justo da polícia tinha aumentado de uma média de 2,88/5,0 antes da implementação do programa para 3,04 depois de sua implementação (LA VIGNE et al., 2019).

A partir do levantamento aqui apresentado, analisamos mais detalhadamente quatro treinamentos em justiça procedimental, selecionados entre aqueles que foram avaliados e tiveram os resultados divulgados. Os treinamentos contrastam em formato e modelos de implementação e foram desenvolvidos por forças policiais cujo relacionamento com o público varia em qualidade: programa da polícia de Chicago, por ser o pioneiro entre os treinamentos; de Seattle e de Manchester, por oferecerem metodologias alternativas de justiça procedimental; e de Queensland, por ser o único treinamento focado na justiça procedimental dentro da instituição policial14.

Quadro 2 – Materiais primários e secundários dos treinamentos analisados

Chicago Seattle Manchester Queensland

PRIMÁRIOS

- Slides das aulas do Quality Interaction Training Programme;

- 12 vídeos usados nas aulas15;

- PDF resumindo o que os instrutores trabalhavam em cada aula

- Documento resumindo a teoria de justiça procedimental usada no curso;

- Formulário com a estrutura da reunião entre supervisor e o policial e os objetivos da reunião;

- Roteiro do diálogo entre o supervisor e o policial.

- Informações enviadas por e-mail pelo instrutor Paul Quinton sobre as interações com os policiais durante o treinamento e sobre como estruturar o curso. Nada foi disponibilizado

SECUNDÁRIOS

Artigos resumindo o treinamento e a metodologia usada (SKOGAN; VAN CRAEN; HENESSY, 2015; WOOD; TYLER; PAPACHRISTOS, 2020) Artigo analisando a conduta dos policiais após o treinamento (OWENS; WEISBURG; AMENDOLA, 2016)

- Artigo, escrito pelos instrutores detalhando a metodologia do treinamento e as observações dos policiais pós treinamento (WHEELER; QUINTON; FILDES; MILLS, 2013);

- Relatório analisando resultados do treinamento (QUINTON; PACKHAM, 2016).

Artigo escrito pelos instrutores detalhando a metodologia do treinamento e seus resultados (SERGEANT; ANTROBUS; PLATZ, 2017)

Fonte: Elaborado pelos autores.

Treinamento do Departamento de Polícia de Chicago

Criado em 1835, o Chicago Police Department é o segundo maior departamento de polícia dos Estados Unidos, atrás somente da polícia de Nova Iorque. Chicago é uma cidade que apresenta grande diversidade na composição étnica de sua população, característica importante para entender o trabalho dessa polícia. Atende, segundo dados de 2013, uma população de 2.714.856 habitantes, contando com 12.042 policiais (44 policiais/10.000 habitantes)16. Entre os policiais, 52% eram brancos, 19% hispânicos, 25% negros e 0,3% asiáticos, numa população de 32% brancos, 29% hispânicos, 31% negros e 6% asiáticos.17

Para iniciar na carreira, o candidato precisa ter entre vinte e um e quarenta anos de idade. A Divisão de Educação e Treinamento (Education and Training Division) é responsável pelo curso de formação, que dura cerca de novecentas horas e inclui treinamentos para uso de armas de fogo, táticas de controle, treinamento físico, com sessões em sala de aula e treinamento baseado em cenários. O curso prepara o candidato para o Exame de Certificação do Oficial de Paz do Estado de Illinois (Illinois State Peace Officer’s Certification Exam), que o habilita para a atividade policial.18 O salário inicial do policial é de cerca de seis mil dólares por mês.

No início dos anos 1990, a polícia de Chicago ficou conhecida por implementar mudanças organizacionais e dar início a um programa de policiamento comunitário. O objetivo consistia em melhorar a histórica relação pouco positiva entre a polícia e a população, especialmente entre negros e latinos (SKOGAN, 2006a). A cidade de Chicago apresenta índices de homicídios e criminalidade acima da média norte-americana, relacionados às gangues presentes em várias comunidades, e a polícia local é vista como ilegítima, especialmente por moradores da parte sul, onde a criminalidade e a letalidade policial se concentram (VITALE, 2017; WEICHSELBAULM, 2016).

Desenvolvido por dois criminologistas de Yale, Tom Tyler e Tracey Meares, e membros da academia de polícia local (SKOGAN; VAN CRAEN; HENESSY, 2015), o Programa de treinamento de Chicago Quality Interaction Program (Programa de Interação de Qualidade, sigla em inglês QIP) é um treinamento pioneiro em justiça procedimental para policiais. O QIP foi incorporado ao programa de treinamento policial graças ao apoio político do prefeito Rahm Emmanuel (2011-2019) e do então comandante da polícia de Chicago Garry McDonald, os quais se comprometeram a mudar a cultura de violência, corrupção e falta de transparência da polícia (SKOGAN; VAN CRAEN; HENESSY, 2015). Além do treinamento, o comandante McDonald priorizou a parceria com pesquisadores em várias áreas da burocracia policial da cidade, tornando Chicago um “laboratório de ciências policiais” (WEICHSELBAULM, 2016).

O QIP é composto por cinco módulos. O primeiro introduz os princípios de justiça procedimental e expõe como esses princípios são compatíveis com os objetivos da polícia. O segundo módulo desenvolve um debate sobre ‘ceticismo’ dentro da corporação, incentivando os policiais a falarem sobre como suas condutas cotidianas podem ser afetadas por um senso de pessimismo e resignação decorrentes da falta de reconhecimento do público e da participação em enfrentamentos violentos. O terceiro discute o impacto da justiça procedimental na legitimidade policial. O quarto módulo relata o contexto histórico de racismo e policiamento nos EUA. O quinto debate o tópico anterior e encerra com um vídeo sobre como a justiça procedimental pode ser implementada num cenário real de policiamento.

Entre 2012 e 2015, 8.700 policiais (mais de 70% da unidade policial) e duzentos e trinta alunos da academia de polícia participaram do treinamento, que teve carga horária de oito horas e cujos instrutores eram policiais da ativa que tinham sido treinados por Tyler e Meares. O fato de policiais da ativa ministrarem o curso visava reforçar a ideia de que a justiça procedimental representava uma questão prática e não uma teoria abstrata, limitada à Universidade. Dez meses após o treinamento, levantamento junto aos alunos apontou aumento nos índices de aprovação entre eles em três dos quatro princípios da justiça procedimental. O único princípio da justiça procedimental que ainda não era visto de modo positivo pelos policiais era o princípio de participação – ou voz – isto é, o princípio de que os policiais devem levar em consideração o ponto de vista do público antes de tomarem suas decisões (SKOGAN; VAN CRAEN; HENESSY, 2015).

Após a publicação dos resultados promissores, várias unidades policiais e agências federais ligadas ao Departamento de Justiça (Department of Justice) enviaram instrutores para serem treinados em Chicago. O QIP se tornou exemplo de como práticas inovadoras, que combinam teoria com engajamento da corporação, mostram-se capazes de transformar o comportamento de policiais (LA VIGNE et al., 2019).

Além de gerar mais obediência e cooperação por parte do público e melhorar a autolegitimidade dos policiais, havia a expectativa de que a justiça procedimental seria capaz de reduzir a criminalidade. Porém, os índices de criminalidade de Chicago e a conduta da polícia após o lançamento do treinamento evidenciaram os desafios de incorporar a justiça procedimental ao dia a dia do policiamento. O crime de homicídio apresentou seu índice mais alto em 2016, quatro anos após o primeiro curso ter sido ministrado (WEICHSELBAULM, 2016). Além do mais, a unidade policial de Chicago sofreu uma enorme crise de credibilidade após o episódio em que o policial Jason Van Dyke matou Laquan McDonald, um jovem negro de dezessete anos, em outubro de 2014. O policial disparou dezesseis tiros depois de receber uma denúncia de que Laquan estava drogado e carregando uma faca (WEICHSELBAULM, 2016).

O relatório policial justificou os disparos de Van Dyke alegando que Laquan tinha atacado os policiais. Porém, um ano depois, imagens vazadas da câmera da viatura policial mostravam que Laquan estava de costas para o policial e andando na direção oposta aos policiais quando foi alvejado (WEICHSELBAULM, 2016). O vídeo causou um escândalo de proporções nacionais para a polícia de Chicago e a prefeitura da cidade. O DOJ abriu investigação de corrupção e falta de transparência na unidade policial (SOUTHORN; LAZARE, 2019) e McCarthy, chefe da polícia que ajudou a desenvolver o treinamento de justiça procedimental, foi demitido (WEICHSELBAULM, 2016).

Resultados da investigação do DOJ publicados em janeiro de 2017 mostraram que a unidade policial operava sem fiscalização da prefeitura e cultivava uma cultura de violência e ocultação de delitos cometidos por policiais. A investigação também denunciou a inadequação da capacitação dos policiais para a realidade do trabalho policial na cidade. Como resultado, o treinamento em justiça procedimental foi reativado e, desde então, todos os policiais são obrigados a participar do treinamento (SOUTHORN; LAZARE, 2019).

Havia a expectativa de que todos os policiais passassem pelo treinamento até o final de 2020. Contudo, uma investigação do site de notícias The Intercept revelou que dezesseis dos dezessete policiais responsáveis por lecionar o curso de justiça procedimental em Chicago acumularam um total de cento e onze reclamações de conduta abusiva e ilegal, incluindo acusações de prisões arbitrárias e uso excessivo da força (SOUTHORN; LAZARE, 2019). Isso lançou dúvidas sobre o treinamento e críticas sobre a proteção institucional oferecida aos policiais envolvidos em condutas violentas.

Apesar dos transtornos, resultados de longo prazo do treinamento de Chicago publicados em agosto de 2019 revelaram resultados promissores. O número de reclamações acerca da conduta policial abusiva pelo público reduziu 14%, enquanto o uso da força por policiais caiu 8,7%. Desde que o treinamento foi lançado, em 2012, e comparando-se aos cinco anos anteriores, o município de Chicago pagou três milhões de dólares a menos em disputas judiciais envolvendo policiais (WOOD; TYLER; PAPACHRISTOS, 2020).

Treinamento do Departamento de Polícia de Seattle

Criado em 1869, o Seattle Police Department é o 37º maior departamento de polícia dos Estados Unidos. No ano de 2013, atendia uma população de 634.535 pessoas e tinha 1.285 policiais (20 policiais/10.000 moradores). Entre esses policiais, 75% eram brancos, 5% hispânicos, 9% negros e 9% asiáticos, enquanto a população era formada de 66% brancos, 7% hispânicos, 7% negros e 14% asiáticos.19 Para se tornar policial, o candidato deve ter no mínimo 20,5 anos, não havendo limite máximo de idade. Também não há requisitos para altura, peso, visão, audição ou histórico de saúde, desde que o candidato esteja apto para ser aprovado nos testes de admissão e no curso de formação e possa desempenhar todas as funções do trabalho policial cotidiano.20 O salário inicial é de seis mil e oitocentos dólares por mês. Depois de três anos trabalhando na patrulha, os policiais podem solicitar transferência para unidades especializadas e se tornam elegíveis para a escola de detetives.21

Enquanto o modelo de treinamento em justiça procedimental de Chicago visava treinar policiais em salas de aula, pesquisadores das universidades de Pensilvânia, George Mason, Carolina do Sul e do centro de pesquisa Police Foundation desenvolveram um treinamento baseado em diálogo direto entre subalternos e seus supervisores para a polícia de Seattle (OWENS et al., 2016). O diálogo ocorria no contexto de uma reunião de avaliação que durava de vinte a trinta minutos. Durante a reunião, o supervisor usava conceitos da Teoria da Justiça Procedimental no intuito de esclarecer como os policiais poderiam interagir com o público de maneira mais eficaz e cooperativa. Diferentemente dos professores de Chicago, os supervisores de Seattle não receberam treinamentos nos preceitos da TJP, mas seguiram um ‘roteiro para o diálogo’ elaborado pelos pesquisadores. Em 2013, entre setembro e novembro, duzentos e quarenta e um policiais participaram de reuniões com seus supervisores enquanto se observou o mesmo número de policiais, os quais não receberam instruções de justiça procedimental, como grupo de controle (OWENS et al., 2016).

Em vez de treinar policiais de todas as unidades, os pesquisadores de Seattle criaram um modelo estatístico a fim de identificar policiais que apresentavam maior probabilidade de enfrentar situações de alto risco, baseados na área de patrulhamento, na regularidade com que esses policiais usavam suas armas, nas reclamações de cidadãos e no tempo que eles estavam na corporação (OWENS et al., 2016). Policiais que se encaixaram no perfil receberam instruções relacionadas à TJP na reunião com seus supervisores. O treinamento de Seattle também se diferencia por ser o único, além do treinamento de Manchester, que incluiu um estudo que acompanhou a conduta de policiais pós-treinamento. Após as reuniões, os policiais foram observados pelos seus supervisores durante seis semanas. As observações focavam na frequência com que recorriam à força violenta e na frequência de reclamações do público.

As observações realizadas pelos supervisores, uma semana depois de iniciado o treinamento, indicaram que os policiais que receberam instruções em justiça procedimental tinham 26% menos probabilidade de resolverem uma situação com uma prisão (OWENS et al., 2016); número que diminuiu para 12% seis semanas após o término do treinamento. O grupo que recebeu treinamento teve 50% menos interações que envolviam o uso da força violenta comparado com o grupo de controle. Porém, ambos os grupos receberam o mesmo número de reclamações do público.

Pesquisas realizadas com os policiais após o período de observações revelaram que os policiais não conseguiam entender o motivo do treinamento que estavam recebendo, pois a maioria das reuniões com os supervisores ocorrera após falhas disciplinares. Os policiais entendiam que as reuniões significavam uma forma de punição às más condutas. Esses resultados confirmaram os de outras pesquisas que indicavam que a qualidade da relação entre policiais e seus superiores era fundamental para a consolidação de procedimentos justos dentro da corporação (OWENS et al., 2016).

Treinamento da Polícia de Manchester

A Greater Manchester Police é a quinta maior força policial no Reino Unido, responsável pelo policiamento da região metropolitana de Manchester. Foi criada em 1974, a partir da unificação das forças policiais das cidades de Manchester (Manchester City Police, formada no final da década de 1830), de Salford (Polícia de Salford City, criada em 1844) e partes das forças policiais de Lancashire Constabulary, Cheshire Constabulary e West Yorkshire Constabulary.22

Em 2019, a região metropolitana de Manchester tinha 2.812.600 habitantes e mais de seis mil policiais (21 policiais/10.000 habitantes)23, dos quais 93% são brancos. Somente 7% da força policial é formada por pessoas de outros grupos étnicos, enquanto 16% da população se identifica nesta mesma categoria.24

Para se tornar policial, é necessário ter no mínimo dezoito anos de idade. Não há requisitos educacionais formais, mas exige-se que os candidatos tenham um bom padrão de inglês, falado e escrito; há interesse em candidatos que falem idiomas de comunidades presentes na cidade; e o processo de seleção inclui entrevista, teste físico, exame médico e investigação social.25 O candidato é submetido ao Initial Police Learning and Development Programme (IPLDP), programa de dois anos de duração, aproximadamente 35 semanas de treinamento. Ao final, os aprovados recebem o Diploma em Policiamento (PC).26 O salário inicial é de dezenove a vinte e três mil libras ao ano.27 Os policiais que trabalham em período integral cumprem média de quarenta horas de serviço por semana em turnos de oito horas.

O treinamento em justiça procedimental realizado com policiais de Manchester visava melhorar a comunicação entre policiais e vítimas de crime, uma vez que os comandantes da unidade policial (Chief Officers) constataram que vítimas de crimes em Manchester relatavam grau maior de insatisfação com o tratamento policial do que vítimas em outras partes do Reino Unido. Desenvolvido por instrutores da academia de polícia local, o College of Policing, enfatizavam menos os quatros princípios de justiça procedimental do que os treinamentos de Chicago e Seattle (WHELLER et al., 2013). Os instrutores de Manchester tinham como foco ensinar técnicas de comunicação especificamente voltadas a melhorar o atendimento às vítimas de crimes. Após aprender as técnicas, os policiais participaram de encenações a fim de aplicar a justiça procedimental nas interações com vítimas.

As encenações duravam trinta minutos e simulavam o atendimento às vítimas de crimes de menor escala, ou vítimas de comportamento antissocial. Os instrutores da academia de polícia faziam o papel das vítimas durante a simulação e, após a encenação, cada aluno passava trinta minutos preenchendo um formulário e refletindo sobre o diálogo com a vítima. Nos últimos trinta minutos do treinamento, o aluno recebia uma avaliação dos instrutores relatando a eficácia das técnicas de comunicação usadas.

Em 2013, participaram do treinamento 566 policiais da ativa (8% da corporação), que teve duração de catorze horas, divididas em três dias. Após o treinamento, os pesquisadores monitoraram e avaliaram como os policiais interagiram com vítimas de crime durante o período de duas semanas. Para isso, acompanhavam os policiais em seus patrulhamentos e usavam os princípios da TJP para avaliar as interações com vítimas. Os resultados indicaram que 48% dos policiais que participaram do treinamento tiveram relações consideradas excelentes com o público, enquanto 22% do grupo de controle (que não foi submetido ao treinamento) recebeu a mesma avaliação (WHELLER et al., 2013). Além disso, 68% dos participantes avaliaram o curso como muito bom e sinalizaram que o treinamento tinha relevância para o trabalho.

O treinamento de Manchester e as observações do comportamento policial pós-treinamento ajudaram a avançar na ideia de que treinamentos de justiça procedimental não precisam focar exclusivamente na TJP, como o de Chicago (WHELLER et al., 2013). Em vez de restringir o ensino aos conceitos teóricos, os instrutores de Manchester criaram um ambiente aberto em que os policiais puderam desabafar acerca das dificuldades de lidar com vítimas (WHELLER et al., 2013).

Comparado a outros treinamentos de justiça procedimental, a polícia de Manchester criou um treinamento mais inclusivo, com os policiais apontando dúvidas e aspectos que tornavam o trabalho difícil. Com isso, os alunos não apenas recebiam instruções de conduta, mas guiavam os instrutores, os quais, por sua vez, buscavam atender às necessidades apresentadas pelos policiais. As encenações também incorporaram elementos práticos para o treinamento e ajudaram os policiais a entenderem como as técnicas de comunicações poderiam ser aplicadas. Em geral, os resultados do treinamento de Manchester sinalizam o impacto positivo que iniciativas de justiça procedimental podem ter na atividade policial (WHELLER et al., 2013).

Treinamento da Polícia de Queesnland

Criada em 1864, a Queensland Police Service é a terceira maior força policial da Austrália. Segundo o censo de 2016, Brisbane, capital do estado de Queensland, tinha mais de dois milhões de habitantes em sua região metropolitana. As ascendências mais comuns são: inglesa (26,6%), australiana (23,2%), irlandesa (8,8%), escocesa (7,4%) e alemã (4,3%). Aborígenes e/ou pessoas provenientes das Ilhas do Estreito de Torres compunham 2,4% da população. Cerca de 80% da população fala a língua inglesa.28 Atualmente, a agência conta com mais de onze mil policiais (22 policiais/10.000 habitantes) e, segundo relatório institucional, 85% das pessoas de Queensland estavam satisfeitas com seu contato mais recente com a Queensland Police Service.29

Para se tornar policial, há um processo de recrutamento contínuo, ao longo do ano, sem interrupção. Entre os requisitos para iniciar a carreira está idade mínima de dezoito anos (não há limite máximo de idade) e há aposentadoria compulsória aos sessenta anos. Para ser aprovado, o candidato precisa passar no exame de ‘habilidades de policiamento aplicado’, demonstrando que é capaz de cumprir os requisitos físicos da atividade policial. O processo seletivo visa representar a diversidade da comunidade atendida no que diz respeito a: faixa etária, etnia, gênero, deficiência, origem cultural, orientação sexual, nível educacional e socioeconômico, religião, estado civil etc. Essa estratégia é considerada uma forma de garantir maior produtividade dos policiais e melhor atendimento aos cidadãos, pois ajudaria as pessoas dos diversos grupos da comunidade a se sentirem valorizadas, incluídas e acolhidas, tratadas de forma justa, respeitosa e com igual acesso às oportunidades.30

A formação dura seis meses, seguida por mais doze meses no programa de primeiro ano como “Constable”. O salário inicial do policial é de seis mil dólares australianos por ano.31 Em 1987, estabeleceu-se uma comissão investigativa, presidida por Tony Fitzgerald, que revelou a má conduta policial e a corrupção endêmica e levou a mudanças nas práticas de recrutamento, treinamento, educação, promoções e transferências, além da implementação de mecanismos eficazes de responsabilização tanto da organização quanto dos policiais individualmente. Tal reforma pretendia alterar a estrutura paramilitar da polícia, a qual promovia grande concentração de autoridade e de tomada de decisão, dificultando a gestão e a responsabilização dos seus agentes (FLEMING; LAFFERTY, 2000). Assim, o modelo de organização influenciou o tipo de treinamento desenvolvido naquele departamento de polícia.

Por reconhecer que as dinâmicas injustas entre superiores e subalternos são reproduzidas em procedimentos envolvendo o público, desenvolveu-se um programa de treinamento em justiça procedimental focado nas relações internas da polícia. Pesquisadores da Polícia Federal australiana e das universidades de Griffith e Queensland criaram um modelo de treinamento chamado Voice4Values (Voz para Valores), exclusivo para alunos da academia de polícia. O treinamento durava três horas e focava em como identificar e resistir aos comportamentos racistas e machistas de comandantes policiais, bem como discutia os riscos da obediência incondicional. O Voice4Values foi desenvolvido após enquetes revelarem que as policiais sofriam, em média, um caso de assédio a cada dois anos dentro da corporação. Durante 2015, duzentos e sessenta alunos receberam o treinamento e outros duzentos e sessenta alunos formaram um grupo de controle (SARGEANT; ANTROBUS; PLATZ, 2017).

Enquanto todos os outros treinamentos policiais de justiça procedimental se voltavam a policiais da ativa, em Queensland o foco consistiu na tentativa de se mudar a cultura policial entre os alunos ainda em formação. Segundo os pesquisadores envolvidos, o treinamento de policiais em formação pode ter maior impacto na redução dos casos de má conduta do que os cursos obrigatórios de aperfeiçoamento a policiais da ativa. Além de abordar questões relacionadas ao machismo e à falta de diversidade em unidades policiais, o Voice4Values incorporou um curso do Federal Bureau of Investigations (FBI), dos EUA, que examinava como as relações abusivas dentro da corporação debilitam a eficiência policial (SARGEANT; ANTROBUS; PLATZ, 2017).

A palestra inicial do treinamento ressaltava a importância da diversidade racial e de gênero na corporação. Os instrutores apresentavam cenários exemplificando como o uso de linguagem machista podia corroer as relações internas na polícia. A segunda parte do curso incluía a exibição de vídeos a respeito do Holocausto com o objetivo de provocar o debate crítico sobre a cultura de violência policial e a obediência absoluta. Um sobrevivente do Holocausto participou do treinamento relatando aos alunos a sua experiência com os guardas nazistas. Ao final, os instrutores facilitaram um debate com os alunos quanto ao conteúdo do treinamento e sua relevância para a criação de relações mais igualitárias entre subalternos e superiores na polícia. Surveys realizados com os alunos, seis semanas após o término do treinamento, indicavam que o grupo tinha maior relutância em obedecer às ordens incondicionalmente do que o grupo de controle (SARGEANT; ANTROBUS; PLATZ, 2017).

Considerações finais

O levantamento que apresentamos aqui nos permitiu expor como diferentes polícias, com diferentes históricos e atuações em contextos sociais bastante distintos, apropriam-se dos conceitos de justeza procedimental. Os treinamentos apresentados avançam consideravelmente na aplicabilidade da justiça procedimental para o policiamento e variam em relação às metodologias usadas, aos resultados obtidos e contextos de legitimidade policial em que foram implementados.

O primeiro aspecto a ser destacado é que a realização dos treinamentos se deu porque ocorreu um processo de reconhecimento da existência de problemas nessas forças policiais e da necessidade de se implementar mudanças para a correção no modo como seus agentes atuavam. O que não está desvinculado do fato de que as polícias analisadas sabem que a imagem que a população tem delas é um poderoso termômetro de como será o ambiente em que desenvolverão o seu trabalho, seja ele de policiamento, seja de investigação.

O segundo aspecto reside no fato de que se adotam os treinamentos no intuito de que interfiram em diferentes problemas dentro das corporações, ou seja, desde problemas estruturais e de longa data até problemas mais pontuais da prática policial. O treinamento para a polícia de Chicago lidava com um contexto em que a instituição sofria amplas críticas da sociedade por sua histórica conduta truculenta e racista (WEICHSELBAULM, 2016). O treinamento significava, entre outras medidas, uma tentativa de reconstruir a imagem desgastada da instituição junto ao público.

Em Seattle, o principal objetivo do treinamento parece ter sido o de interferir, diretamente, no modo como policiais considerados ‘problemáticos’ agiam em seus contatos com os cidadãos. Talvez Manchester se constitua no contexto mais positivo entre os apresentados. Ainda que sua imagem tenha se desgastado nos últimos anos, a polícia na Inglaterra é tradicionalmente reconhecida como uma das instituições mais confiáveis e admiradas pela população (BRADFORD; QUINTON, 2014). Além disso, no treinamento os policiais não se tornaram meros receptores de informação, mas sim participaram do processo de reflexão quanto aos aspectos importantes para a legitimidade da polícia.

Já o treinamento de Queensland é o mais singular, o que pode estar relacionado ao processo de reforma da instituição iniciado nos anos 1980. Aborda questões internas da instituição policial, exclusivamente com policiais em processo de formação, aqueles que ainda não absorveram todos os aspectos da cultura policial. Essa abordagem tenta reduzir resistências, uma vez que há evidências de que, ao longo do tempo, a cultura cotidiana da polícia tende a se diferenciar dos valores institucionais aprendidos na academia (SARGEANT; MURPHY; MADON, 2018).

O terceiro aspecto consiste na participação de instituições de ensino e pesquisa, externas às polícias, na elaboração e até na aplicação dos treinamentos. A parceria das polícias com Universidade e grupos de pesquisa revela a busca por um treinamento qualificado, construído com base em levantamentos e experiências prévias, bem como por acompanhamentos posteriores que avaliem o que se implementou.

Não podemos ignorar que os treinamentos apresentam limitações, uma vez que todos foram lançados como estudos exploratórios. Apenas o treinamento de Chicago se tornou parte integrada do programa de treinamento policial. Além do mais, pesquisas realizadas com policiais que participaram nos treinamentos ressaltaram o ceticismo inerente deles quanto às ideias relacionadas à justiça procedimental. A experiência de Seattle, em que policiais relacionaram o treinamento à punição por más condutas, evidencia as dificuldades de implementar mudanças visando a igualdade e o respeito mútuo em corporações fortemente hierarquizadas e punitivas. Manchester e Queensland tentaram lidar diretamente com tais questões ao implementarem treinamentos baseados em diálogos e processos de reconhecimentos das injustiças e dos abusos existentes em unidades policiais.

Todas as experiências ocorreram em polícias de democracias liberais que, em maior ou menor grau, são herdeiras da filosofia do policiamento por consentimento. Logo, apresentam em sua base a ideia de que o poder de polícia não deriva exclusivamente da sua justificação legal, mas há um elemento moral no senso de obrigação de obediência que deriva dos julgamentos concernentes à legitimidade da autoridade.

A partir de suas filosofias, as polícias se organizam e se estruturam, selecionam e treinam seus policiais, estabelecem padrões quanto ao que entendem por segurança pública e policiamento, aspectos que certamente impactam em qualquer treinamento. Como então pensar treinamentos em TJP para polícias como as nossas? Como lidar com questões sensíveis aos nossos policiais – por exemplo, o uso da força, a participação da comunidade no policiamento, os salários e as promoções nas instituições, as condições de trabalho – a fim de torná-las compatíveis com a ideia de tratamento justo e respeitoso? Como abordar os temas da TJP com policiais de uma instituição militarizada, algo inédito nas experiências existentes? Nesse sentido, como abordar a qualidade das relações dentro de instituições onde a hierarquia organiza não somente as funções e responsabilidades de cada um, mas também define a estrutura de reconhecimento, status e privilégios? Essas são questões que certamente precisam ser levadas em consideração em nosso contexto.

A introdução dos treinamentos em TJP pode se tornar o primeiro passo para a reflexão dos procedimentos dentro da própria instituição e no debate a respeito de qual polícia temos e qual polícia queremos ter. Esse talvez represente o ponto central dos treinamentos. Na realidade, todos estão retomando a própria ideia do que é ser policial para, a partir disso, incentivar formas de policiamento baseadas em relações mais democráticas e mutuamente benéficas à polícia e ao público.

A TJP tem como foco a legitimidade enquanto motor que gera obediência à autoridade (TYLER, 2017). Se ainda não é possível sabermos o quanto os programas de treinamento em justiça procedimental impactam na legitimidade da polícia, sabemos que têm a capacidade de melhorar as interações dos policiais com o público. O que está relacionado ao fato de os treinamentos colocarem em evidência que a autoridade policial legítima é aquela que foca em procedimentos respeitosos e eficientes, e não exclusivamente no poder discricionário de empregar o uso da força, como ainda fazem muitas polícias. Ao incorporar a justiça procedimental nas suas funções cotidianas, a polícia deixa de ser percebida pelo público somente como uma força policial para se percebida como um serviço policial (TYLER, 2017).

Em vez de um contingente truculento, a polícia passa a ser percebida como um agente capaz de articular relações de confiança e cumplicidade com a sociedade. O argumento de Tyler de que apenas experiências procedimentais podem mudar as atitudes da polícia parece se constituir num incentivo poderoso para que o treinamento em justiça procedimental seja adotado pelas forças policiais mundiais.

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ANEXO

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  1. Este levantamento é parte integrante do Projeto CEPID “Building Democracy Daily: Human Rights, Violence and Institutional Trust”, desenvolvido pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV/USP). Processo nº 2011/51346-9, Fundação do Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).↩︎

  2. Consideramos o termo que expressa mais claramente a ideia de “procedural justice”, da percepção de uma conduta em conformidade com o que é esperado/de direito.↩︎

  3. A primeira etapa do levantamento, entre maio de 2019 e março de 2020, consistiu na busca em páginas do Google e em agregadores de artigos acadêmicos (Google Scholar, Scielo e JSTOR), usando as palavras “procedural justice” e “police training”. Foram identificados treinamentos, experiências de aplicação e avaliação, publicados em artigos acadêmicos, em websites e em relatórios de agências policiais.↩︎

  4. Fonte: https://fipolicing.com/fip-training-courses/. Acesso em: 13 fev. 2020. ↩︎

  5. Programa pioneiro criado na unidade policial de Chicago em 2012, ver mais adiante.↩︎

  6. Fonte: https://trustandjustice.org/pilot-sites. Acesso em: 13 fev. 2020. ↩︎

  7. O Fair and Impartial Policing é uma empresa privada que desde 2014 oferece cursos relacionados aos temas da justiça procedimental e preconceito (implicit bias) para policiais. A empresa foi criada por Lorie Fridell, professora de criminologia da University of Southern Florida. Os 22 instrutores que lecionam no curso da empresa são todos ex-delegados de polícia norte-americanos. Fonte: https://fipolicing.com/fip-training-courses/. Acesso em: 13 fev. 2020. ↩︎

  8. Fonte: https://www.ncjrs.gov/pdffiles1/nij/grants/249881.pdf. Acesso em: 13 fev. 2020. ↩︎

  9. Fonte: https://fipolicing.com/fip-training-courses/. Acesso em: 13 fev. 2020.↩︎

  10. Fonte: https://pdfs.semanticscholar.org/cfd9/fcf8e139e8e7371984b4858c33e4ea528f0a.pdf. Acesso em: 13 fev. 2020. ↩︎

  11. Fonte: http://scottishjusticematters.com/wp-content/uploads/Pages-from-SJM_3-2_June2015_Policing-and-Procedural-Justice.pdf. Acesso em: 13 fev. 2020. ↩︎

  12. Fonte: https://www.povertyactionlab.org/evaluation/building-effective-resilient-and-trusted-police-organizations-mexico-city. Acesso em: 13 fev. 20. O treinamento na Cidade do México foi realizado em 2017, organizado pela Universidade de Yale e pela ONG Poverty Action Lab. 2.240 policiais receberam o treinamento de três dias. O treinamento seguiu o mesmo modelo do programa pioneiro de Chicago. Apesar do contexto mexicano oferecer várias análises comparativas com o policiamento no Brasil, o treinamento da Cidade do México não publicou seus resultados ainda. Portanto, baseado nos princípios metodológicos, não foi incluído no artigo.↩︎

  13. Quarenta e dois artigos publicados em periódicos abordam treinamentos policiais relacionados à justiça procedimental. Ver Anexo.↩︎

  14. Na segunda etapa do levantamento foi solicitado aos pesquisadores e policiais que realizaram os treinamentos (Chicago, Manchester, Seattle e Queensland) material utilizado e que pudesse ser disponibilizado: apostilas, palestras, slides, vídeos, etc. Recebemos materiais somente dos treinamentos de Chicago e Seattle. Os treinamentos de Manchester e Queensland foram analisados a partir de relatórios e artigos disponíveis online.↩︎

  15. Os vídeos incluíam: dois clipes de noticiário local mostrando policiamento comunitário; três exemplos de policiamento justo; três exemplos de policiamento truculento; declaração do padre da corporação apoiando o treinamento; resumo da história das corporações policiais nos EUA; clipe da série de TV norte-americana ‘Cops’; entrevista com o chefe da polícia de Chicago explicando o treinamento.↩︎

  16. Páginas de internet consultadas

    BUREAU OF JUSTICE STATISTICS. Local Police Departments, 2013: Personnel, Policies, And Practices. Disponível em: https://www.bjs.gov/content/pub/pdf/lpd13ppp.pdf. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  17. GOVERNING: THE FUTURE OF STATES AND LOCALITIES. Disponível em: https://www.governing.com/gov-data/safety-justice/police-department-officer-demographics-minority-representation.html. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  18. CHICAGO POLICE DEPARTMENT. Disponível em: https://home.chicagopolice.org. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  19. GOVERNING: THE FUTURE OF STATES AND LOCALITIES. Police Department Race and Ethnicity Demographic Data. Disponível em: https://www.governing.com/gov-data/safety-justice/police-department-officer-demographics-minority-representation.html. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  20. SEATTLE POLICE DEPARTMENT. Police Officer Candidates' Frequently Asked Questions. Disponível em: https://www.seattle.gov/police/police-jobs/about-police-jobs/frequently-asked-questions#arethereanyageorphysicallimitationsonwhocanapplyforthejob. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  21. SEATTLE POLICE DEPARTMENT. Police Officer Candidates' Frequently Asked Questions. Disponível em: http://www.seattle.gov/police/police-jobs/about-police-jobs/frequently-asked-questions. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  22. A fusão seguiu a reorganização dos governos locais realizada no país em 1968. Inicialmente denominada Polícia de Manchester e Salford, em 1974, com a criação do Condado Metropolitano de Greater Manchester, passou a se chamar Greater Manchester Police.↩︎

  23. UK PARLIAMENT. Disponível em: www.parliament.uk/commons-library|intranet.parliament.uk/commons-library. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  24. GREATER MANCHESTER POLICE. Disponível em: https://www.police.uk/greater-manchester/PC12/performance/diversity/#gender-by-worker-type. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  25. GREATER MANCHESTER POLICE. Disponível em: https://www.gmp.police.uk/police-forces/greater-manchester-police/areas/greater-manchester-force-content/careers/careers/police-officers/officer-eligibility-and-vetting/. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  26. COLLEGE OF POLICING. Disponível em: https://www.college.police.uk/What-we-do/Learning/Curriculum/Initial-learning/Pages/Initial-learning.aspx. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  27. UK PARLIAMENT. Disponível em: https://www.parliament.uk/documents/commons-committees/home-affairs/HC-67-I-Leadership-Report-FINAL.pdf. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  28. AUSTRALIAN BUREAU OF STATISTICS. 2016 Census. Disponível em: https://quickstats.censusdata.abs.gov.au/census_services/getproduct/census/2016/quickstat/3GBRI?opendocument. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  29. QUEENSLAND POLICE. Annual Report 2018-2019. Disponível em: https://www.police.qld.gov.au/qps-corporate-documents/reports-and-publications/annual-report-2018-2019. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎

  30. QUEENSLAND POLICE. Diversity and Inclusion. Disponível em: https://www.police.qld.gov.au/units/police-recruiting/diversity-and-inclusion. Acesso em: 15 fev. 2020.↩︎

  31. QUEENSLAND POLICE. What we offer. Disponível em: https://www.police.qld.gov.au/units/police-recruiting/what-we-offer. Acesso em 15 fev. 2020.↩︎