REVISÃO SISTEMÁTICA DOS INDICADORES DE EFICÁCIA EM BANCOS DE DNA FORENSES1

Mara Célia Ferreira Ataide

Mestra e doutoranda em Administração, pelo Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal de Goiás, Brasil. Perita criminal em Superintendência de Polícia Técnico Científica de Goiás, Brasil.

País: Brasil Estado: Goiás Cidade: Goiânia

Email: maracfa@policiacientifica.go.gov.br Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7569-3217

Marcos de Moraes Sousa

Doutor em Administração pela Universidade de Brasília (UnB). Professor de ensino técnico e tecnológico do Instituto Federal Goiano Campus Ceres e professor permanente credenciado no Mestrado e Doutorado em Administração da Universidade Federal de Goiás - PPGADM/UFG e no ProfEPT do Instituto Federal Goiano.

País: Brasil Estado: Goiás Cidade: Ceres

Email: marcos.moraes@ifgoiano.edu.br Orcid: https://orcid.org/0000-0002-0901-0550

Contribuições dos autores:

Mara Célia Ferreira Ataide (primeira autora): contribuiu na pesquisa de conteúdo, estruturação e escrita do artigo.

Marcos de Moraes Sousa (segundo autor): contribuiu na estruturação, composição, correção e revisão do artigo.

RESUMO

O objetivo deste artigo é identificar na literatura como a eficácia tem sido medida em bancos de DNA forenses. O método utilizado foi a revisão sistemática de artigos empíricos e artigos de revisão, entre os anos de 1997 e 2020. Os resultados demonstram que a eficácia dos bancos de DNA tem sido medida por diferentes indicadores, a depender do nível de análise, sendo eles a quantidade de: matches, hits, investigações auxiliadas, casos resolvidos, indivíduos presos ou condenados. A relevância desta pesquisa deve-se à necessidade de estabelecer as variáveis que estão relacionadas ao processo de confronto genético, e como elas podem contribuir para a construção de modelos inferenciais de análise. Contudo, é preciso um exame além do âmbito de investigação, de forma que sejam acompanhados os casos a partir de seu registro até o trânsito em julgado no processo judicial, permitindo critérios mais acurados na avaliação dos serviços públicos relacionados. Para isso, é necessária estrutura informacional integrada. Com essa revisão sistemática e proposição de uma agenda de pesquisa, contribui-se para o tema investigado, à luz da Administração Pública e, mais especificamente, da Administração da Justiça.

Palavras-chave: Banco de DNA. Eficácia. Desempenho. Administração Pública. Revisão Sistemática.

SYSTEMATIC REVIEW OF EFFECTIVENESS INDICATORS IN FORENSIC DNA DATABASES

ABSTRACT

The purpose of this article was to identify in the literature how effectiveness has been measured in forensic DNA databases. The method used was the systematic review of empirical articles and review articles, between the years 1997 and 2020. The results showed that the effectiveness of DNA databases has been measured by different indicators, depending on the level of analysis, being the number of: matches, hits, investigations assisted, cases resolved, individuals arrested or convicted. The relevance of this research is due to the need to establish the variables that are related to the process of genetic confrontation, and how they can contribute to the construction of inferential models of analysis. However, an examination is needed beyond the scope of the investigation, so that the cases are monitored from their registration until the final decision in the judicial process, allowing for greater accuracy criteria in the evaluation of the related public services. For this, an integrated information structure is required. With this systematic review and proposition of a research agenda, this research contribute to the investigated theme, in the light of the Public Administration and more specifically of the Administration of Justice.

Keywords: DNA Database. Effectiveness. Performance. Public Administration. Systematic Review.

Data de Recebimento: 04/05/2021 – Data de Aprovação: 27/10/2021

DOI: 10.31060/rbsp.2023.v17.n1.1527

INTRODUÇÃO

Os bancos de DNA forenses são estruturas informatizadas que armazenam dados genéticos oriundos de pessoas identificadas criminalmente ou de vestígios biológicos encontrados em cenas de crime (AMANKWAA, 2018). Por meio desta ferramenta é possível otimizar o trabalho das Perícias Criminais e, consequentemente, contribuir para a elucidação de crimes. O principal objetivo desses bancos é auxiliar a solucionar crimes, identificando seus autores entre os suspeitos, comparando vestígios biológicos de diferentes cenas de crimes, na identificação de criminosos ou mesmo na exclusão de suspeitos (AMANKWAA, 2018; GILL et al., 2015).

O banco também armazena e compara perfis genéticos de familiares que buscam pessoas desaparecidas ou restos mortais daqueles cuja identificação não foi possível, contudo fica expressamente proibida a comparação desses dados com os dados na categoria criminal (RIBPG, 2019). Vale destacar que em países como Reino Unido e Estados Unidos, é permitida a chamada busca familiar para fins de persecução penal, que visa a identificação por meio do perfil genético do familiar mais próximo e que esteja armazenado no banco, que é comumente usado para rastrear suspeitos principalmente em casos arquivados (MENNEL; SHAW, 2006; WICKENHEISER, 2019). No Brasil, ainda não é possível utilizar esse tipo de recurso.

A Perícia Criminal é uma das organizações que compõe a cadeia de produção de serviços da Segurança Pública e da Justiça Criminal, fazendo ligações entre os aspectos técnico-científico, policial e judicial. Esse é um serviço que pode afetar de forma importante os cidadãos e demanda desafios por parte dos administradores públicos, que precisam se adaptar às mudanças institucionais (RODRIGUES; TOLEDO, 2017).

Atualmente, mais de 94 países utilizam bancos de DNA forense, sendo que 50 deles fazem uso do sistema CODIS (Combined DNA Index System), criado pelo FBI (Federal Bureau of Investigation), nos Estados Unidos (AMANKWAA, 2018; FBI, 2020). O conceito do sistema CODIS atraiu atenção de outros países para seu uso na justiça criminal, sendo considerado um mecanismo eficiente e eficaz, com metodologia dotada de elevado controle para garantir a qualidade dos processos e resultados (MARTIN; SCHMITTER; SCHNEIDER, 2001).

Os conceitos de eficiência, eficácia e efetividade são usados como medidas de sucesso da ação governamental (COSTA; CASTANHAR, 2003). A eficiência está relacionada à tarefa e visa medir o quão ótimo os recursos são utilizados em relação ao que foi produzido; a eficácia está relacionada ao produto e corresponde ao quanto a organização oferta adequadamente dos serviços esperados; e, por fim, a efetividade refere-se aos impactos gerados à sociedade, resultantes do serviço prestado (BASTO et al., 1993; RODRIGUES; TOLEDO, 2017). É importante destacar que eficiência e eficácia são medidas-meios, as quais indicam o caminho para chegar ao fim principal: a efetividade (BASTO et al., 1993).

Para a revisão de literatura, concentrou-se em aprofundar os conhecimentos sobre a medida de eficácia, tendo como objetivo: identificar na literatura como a eficácia tem sido medida em bancos de DNA forense. A importância de se medir a eficácia em serviços e políticas públicas, principalmente aquelas atividades exclusivas de Estado, como as policiais, reside no fato de que é necessário esse tipo de avaliação de maneira regular; como forma de auxiliar os tomadores de decisões, seja para continuidade ou correção da política ou programa (COSTA; CASTANHAR, 2003). Em uma visão mais ampla, Marcovitch (1979) identifica que a eficácia deriva não apenas do potencial de gerar produtos e serviços, fazendo uso dos recursos necessários de forma adequada, mas também moldando aqueles conforme as prioridades da sociedade e o quanto ela exige.

CONTEXTUALIZAÇÃO NORMATIVA E OPERACIONAL

O uso dos bancos de DNA forenses para auxiliar investigações criminais foi disseminado a partir da criação do primeiro banco de perfis genéticos em 1995, no Reino Unido (WICKENHEISER, 2019). Isso possibilitou a utilização de uma nova ferramenta voltada para melhorar o desempenho nos serviços das forças policiais.

Analisando a eficácia em manuais de procedimentos ou recomendações sobre bancos de DNA forenses, é possível verificar que esse aspecto é medido usando diferentes indicadores relacionados às saídas do processo de “confronto genético”, como números de matches, hits e investigações auxiliadas.

O manual de recomendações da Polícia Internacional (Interpol), de 2009, destaca que a eficácia de um banco de perfil genético pode ser medida por meio da quantidade de criminosos identificados ou pela quantidade de hits e matches produzidos. Aqui, esses termos são conceituados como o número de correspondências ou combinações entre perfis genéticos alcançadas em um banco, e são consideradas palavras sinônimas.

Diferentemente da Interpol (2009), o FBI (2019) declaradamente em seu manual operacional destaca que match e hit são termos que não devem ser considerados equivalentes, sendo o primeiro conceituado como uma correspondência candidata e que ao ser confirmada, contextualmente na investigação, passa a ser chamada de hit. Contudo, para o FBI (2019), a eficácia de um banco de perfil genético é medida pelo número de investigações auxiliadas. Nesse sentindo, a Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos (RIBPG) no Brasil também adotou essa mesma medida em seu manual de procedimentos (RIBPG, 2019), seguindo as recomendações do FBI, que também utiliza o sistema CODIS para operacionalizar o processo de confronto genético.

Numa visão sistêmica, as organizações recebem inputs (entradas) do ambiente, transforma-os em seus subsistemas, devolvendo outputs (saídas) ao ambiente por meio de serviços ou produtos (SEABRA, 2001), formado assim uma cadeia produtiva. Rodrigues e Toledo (2017) ressaltam que além de outputs, que seriam quantificáveis no curto prazo, ainda existem outcomes, conceituados como os impactos finais aos destinatários do serviço. Ambas saídas produtivas devem ser medidas, pois estão interligadas.

Essa interação entre informações ocorre no processo de “confronto genético”, realizado pelo sistema CODIS, a fim de identificar a autoria de crimes. Esse processo inicia-se com os inputs de perfis, que são amostras de material biológico encontradas em cenas de crimes chamadas de vestígios, e também amostras de DNA de pessoas condenadas ou criminalmente identificadas (RIBPG, 2019). O primeiro output gerado refere-se a um match (correspondência/correspondência candidata) e trata-se de uma provável correspondência entre perfis, ou seja, significa que houve uma associação entre amostras genéticas; mas que precisa passar por um processo de revisão, confirmação e classificação. Depois de confirmadas, essas correspondências passam a ser chamadas de hits (ocorrências/acertos/correspondências confirmadas), que necessariamente devem contribuir em uma ou mais investigações (FBI, 2019; RIBPG, 2019). Um hit pode contribuir para uma ou mais investigações que ainda não tenha(m) sido resolvida(s), ou seja, em que não havia indivíduo identificado ou comprovação da materialidade do crime por parte de um criminoso; e, quando isso ocorre, tem-se o outcome denominado “investigação auxiliada”, finalizando o processo de confronto, como consta na Figura 1.

Figura 1: Conceitos utilizados no processo de confronto via CODIS

Fonte: Elaborado pelos autores, a partir de FBI (2019).

As informações do processo de confronto genético podem ser consideradas determinantes que impactam na eficácia dos bancos de DNA forenses. A avaliação destas pode identificar se, e o quanto, certas políticas ou projetos relacionados às instituições periciais estão contribuindo para a elucidação de crimes.

MÉTODO

Para identificar como a eficácia tem sido medida em bancos de DNA forenses pela literatura, utilizou-se a revisão sistemática como método de pesquisa. Trata-se de uma técnica que busca informações de forma transparente e estruturada, de modo que outros pesquisadores também possam replicar a pesquisa bibliográfica (GRANT; BOOTH, 2009). Nesta revisão, analisou-se artigos empíricos e artigos de revisão relacionados a bancos de DNA forenses.

A busca por artigos foi realizada em língua inglesa, usando os termos-chave combinados: “effectiveness” AND “DNA database”, assim como “performance” AND “DNA database”. As bases pesquisadas foram Web of Science, Scopus e Science Direct, referente ao período de 1990 a 2020. Tal período justifica-se pois o uso de identificação por DNA em investigações criminais começou a receber notoriedade na década de 1990 (GILL et al., 2015).

Os artigos oriundos das pesquisas encontradas com os termos combinados “performance” AND “DNA database” foram filtrados de modo que somente aqueles que abordavam aspectos sobre eficácia foram analisados, descartando aqueles que explicitamente tratavam de outras medidas de desempenho que não a eficácia, como a eficiência e a produtividade, dentre outras medidas de desempenho.

A seleção dos artigos ficou concentrada naqueles que tratam de aspectos relacionados aos campos de pesquisa de organizações públicas. Isso deve-se ao fato do tema de pesquisa ser multidisciplinar, logo os artigos que reduzem suas informações apenas às áreas da genética, da criminologia, da informação ou afins não foram considerados para análise do conteúdo.

Antes de iniciar a análise dos documentos, realizou-se uma categorização das informações a serem coletas. Entre elas, constam:

abordagem de pesquisa: quantitativa ou qualitativa;

indicador: forma como a eficácia é mensurada;

local de análise: estado, país ou região que o artigo analisou;

objetivo: objetivo geral do artigo analisado;

referência: nomes dos autores e ano de publicação do artigo;

técnica de análise: técnica utilizada para analisar os dados de cada artigo, como estatística descritiva, estatística inferencial, estudo de caso, entre outras;

tipo de documento: artigo empírico ou artigo de revisão.

A partir das informações coletadas foi possível identificar os indicadores utilizados para medir a eficácia dos bancos de perfis genéticos, levando em conta sua evolução no tempo, os países estudados e os aspectos metodológicos envolvidos.

RESULTADOS DA REVISÃO

Entre 21 artigos coletados, categorizados e analisados, 4 são artigos de revisão e 17 são artigos empíricos. O Quadro 1 resume as informações coletadas dos artigos, contendo as referências, o tipo de documento, a abordagem de pesquisa, a técnica de análise e o local de análise.

Quadro 1: Resumo de artigos empíricos e de revisão

Referência Local de análise Tipo de documento Abordagem de pesquisa Técnica de análise
Burrows e Tarling (2004) Reino Unido Artigo empírico Quantitativo Estatística descritiva
Santos e Machado (2017) Países da U.E. participantes do sistema Prüm
Maguire e Hope (2006) Inglaterra e País de Gales
Minervino et al. (2019) Brasil
Gabriel, Boland e Holt (2010) San Francisco – CA, EUA
House et al. (2006) Canadá
Bell (2006) Victoria, Austrália
Ferreira et al. (2015) Distrito Federal, Brasil
Bittencourt e Iwamura (2019) Brasil
Locarno, Corradi e Marino (2019) Mendoza, Argentina
Bruenisholz et al. (2019) Austrália
Crouse et al. (2019) Palm Beach County – FL, Estados Unidos
Walsh, Curran e Buckleton (2010) EUA, Reino Unido, Nova Zelândia e Canadá. Artigo empírico Quantitativo Estatística inferencial
Carvalho et al. (2020) Goiás, Brasil
Davis e Wells (2019) Denver – CO, EUA Artigo empírico Quantitativo Análise multivariada
Werrett (1997) Reino Unido Artigo empírico Qualitativo Estudo de caso
Boonderm et al. (2017) Tailândia Estudo de caso
Amankwaa e McCartney (2018) Reino Unido Artigo de revisão Qualitativo Análise documental
Struyf et al. (2019) Sem limitação geográfica Artigo de revisão Qualitativo Revisão sistemática
Bieber (2006) EUA Artigo de revisão Qualitativo Revisão narrativa
Amankwaa e McCartney (2019) Reino Unido

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

O período dos artigos analisados variou de 1997 até 2020, sendo que o ano com mais publicações foi o de 2019, contando com dois artigos de revisão e seis artigos empíricos sobre o tema, como consta no Gráfico 1.

Gráfico 1: Publicações ao longo dos anos

[CHART]

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Quanto à abordagem de pesquisa, a Figura 2 evidencia que a maioria dos artigos empíricos (N=15) utilizam o método quantitativo, com 12 deles apresentando estatística descritiva como técnica de análise, 2 utilizando-se de estatística inferencial e 1 com análise multivariada (regressão logística). Há ainda o uso do método de pesquisa qualitativo, aplicado como estudo de caso para dois dos artigos empíricos. Já os artigos de revisão caracterizam-se totalmente por abordagem qualitativa, onde apenas um artigo estrutura a revisão de forma sistematizada, enquanto dois são revisões narrativas e outros dois utilizam análise documental.

Figura 2: Características dos artigos analisados

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Em relação aos locais de análise (Gráfico 2), para todos os documentos analisados (N=21), os países mais presentes são Estados Unidos, Reino Unido e Brasil, contando cada qual com 24% (N=5), 19% (N=4) e 19% (N=4) de participação, respectivamente. Os outros países abordados são Austrália (N=2), Canadá (N=1), Argentina (N=1) e Tailândia (N=1). Alguns documentos (N=3) tratam de aspectos da eficácia em bancos de DNA forenses em nível de rede organizacional, como é o caso da Interpol (2009), que trata do tema voltado para todos os países que fazem parte do policiamento internacional; assim como o trabalho de Santos e Machado (2017), que mapearam e analisaram os padrões de correspondência de DNA entre países que fazem parte do Sistema de Prüm, que intercambiam perfis genéticos entre os países membros da União Europeia (U.E.). Também foi analisado o estudo de Walsh, Curran e Buckleton (2010), no qual os autores sugerem um modelo para medir o desempenho em bancos de dados de DNA, utilizando informações dos bancos dos Estados Unidos, do Reino Unido, da Nova Zelândia e do Canadá.

Gráfico 2: Países analisados

[CHART]

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Em relação aos indicadores levantados, alguns tiveram maior frequência, como consta no Quadro 2. Entre os principais indicadores de ordem quantitativa estão: número de matches (N=4), número de hits (N=6), número de investigações auxiliadas (N=3), número de crimes resolvidos (N=2) e número de casos em que houve hit e levaram à condenação ou prisão (N=3).

Quadro 2: Principais indicadores de eficácia levantados

Referência Eficácia mensurada por Local
Amankwaa e McCartney (2018) Nº de matches (correspondências) Reino Unido
Burrows e Tarling (2004) Reino Unido
Santos e Machado (2017) Países da U.E. (Sistema Prüm)
Maguire e Hope (2006) Inglaterra e País de Gales
Walsh, Curran e Buckleton (2010) Nº de hits (correspondências confirmadas) EUA, RU, NZ e Canadá
Minervino et al. (2019) Brasil
Boonderm et al. (2017) Tailândia
House et al. (2006) Canadá
Werrett (1997) Reino Unido
Carvalho et al. (2020) Goiás, Brasil
Ferreira et al. (2015) Nº de investigações auxiliadas Distrito Federal, Brasil
Bittencourt e Iwamura (2019) Brasil
Locarno, Corradi e Marino (2019) Mendoza, Argentina
Bruenisholz et al. (2019) Nº de casos em que houve um hit de perfis e resultaram em uma prisão ou condenação Austrália
Davis e Wells (2019) Denver – CO, EUA
Crouse et al. (2019) Palm Beach County – FL, EUA
Bell (2006) Nº de crimes resolvidos Victoria, Austrália
Bieber (2006) EUA

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Houve ainda outros indicadores levantados, levando em conta aspectos qualitativos que implicariam em efeitos de: detecção, dissuasão, incapacidade, proteção à privacidade, legitimidade e fonte de pesquisa criminológica (STRUYF et al., 2019; AMANKWAA; MCCARTNEY, 2019). A seção a seguir discute em detalhes os indicadores encontrados.

DISCUSSÃO DOS INDICADORES

O resultado das publicações indica que a eficácia em bancos de DNA forenses vem sendo mencionada desde o final da década de 1990, em relação às bases analisadas, havendo publicações continuamente ao longo das décadas de 2000 e 2010. No entanto, foi em 2019 que esse tema começou a receber mais publicações por parte de países diversos. Os países desenvolvidos foram os que mais publicaram artigos oriundos de pesquisas, como Reino Unido, Estados Unidos e Austrália, nesta ordem, sendo que o Reino Unido tem publicado desde 1997, enquanto nos outros dois a data de publicação é a partir de 2006. Já em países em desenvolvimento, como Brasil, Argentina e Tailândia, o assunto passou a ter publicações a partir de 2015; e tem ganhado mais publicações do Brasil, sendo este o país com o artigo mais recente da revisão, de 2020. Essa diversificação de publicações de vários países demonstra ser um reflexo do aumento do interesse acadêmico e da adesão do uso dos bancos de DNA para fins de investigação policial. Até 2019, a Interpol contava com 89 países membros que utilizavam esses bancos para tais fins (INTERPOL, 2019).

Analisando a eficácia em estudos sobre bancos de DNA forense e outros documentos, é possível verificar que esse aspecto é medido usando tanto índices relacionados às saídas do processo de confronto genético quanto saídas relacionadas a um macrossistema que inclui processos da Justiça Criminal.

Uma das saídas utilizadas como métrica de eficácia é o número de matches, fruto do confronto genético em casos criminais, como consta no Quadro 3. Maguire e Hope (2006) mediram a eficácia a partir do número de matches gerados pelo serviço forense no Reino Unido, obtendo uma taxa de correspondência (número de matches/número de perfis) de 59,1% e, em determinada divisão, chegando a uma taxa de 72,7%. Também no Reino Unido, Burrows e Tarling (2004) mediram o desempenho dos serviços forenses para casos de roubo e roubo de automóveis. Os autores utilizaram essa taxa como métrica de eficácia analisando o processo desde o momento da visita ou a coleta na cena de crime, estabelecendo assim um percentual a partir dessas entradas. Quatorze anos depois, Amankwaa e McCartney (2018), ao avaliarem novamente esse banco, após a introdução da Lei de Proteção às Liberdades de 2012, utilizando o mesmo indicador, demonstraram que depois do novo regime de retenção do banco de DNA do Reino Unido, houve uma melhora na produção de matches, alcançando uma taxa de 63,3%.

Quadro 3: Número de matches como indicador para medir a eficácia de bancos de DNA

Referência Objetivo Indicador Local
Amankwaa e McCartney (2018) Analisa os efeitos da Lei de Proteção às Liberdades de 2012, no NDNA. Nº de matches (correspondências) Reino Unido
Burrows e Tarling (2004) Avalia a eficácia de aplicação de técnicas forenses em casos de roubo e roubo de automóveis. Reino Unido
Santos e Machado (2017) Mapeia e analisa os padrões de correspondência de DNA entre países operacionais. Países da U.E. participantes do sistema Prüm
Maguire e Hope (2006) Apresentada uma nova abordagem para medir os resultados do processo no uso na análise de DNA forense. Inglaterra e País de Gales

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Numa avaliação do desempenho do Sistema Prüm, que intercambia perfis genéticos entre países da União Europeia, Santos e Machado (2017) identificaram lacunas nesse sistema. Entre elas, uma medição global ideal foi impossibilitada por falta de padronização em adicionar hits para todos os países pertencentes do sistema. E ainda, a análise quanto à eficácia realizada por eles representa um retrato parcial do sistema Prüm, utilizando como indicador apenas matches para avaliação.

Houve um predomínio do indicador match em estudos do Reino Unido e em países europeus, mostrando que a nomenclatura é influenciada pelo banco de referência da região, no caso o Reino Unido. Isso pode ser confirmado no manual de recomendações da Interpol, que possui sede na França. Para a Interpol (2009), a eficácia pode ser medida pelo número de criminosos identificados e também pelo número de correspondências alcançadas em um banco, tendo os termos hit e match como sinônimos; diferentemente do FBI (2019), que declaradamente informa que são conceitos que não devem ser confundidos, no mesmo sentido segue a RIBPG, no Brasil (RIBPG, 2019).

Outro indicador para medir a eficácia são os números de hits, resumido no Quadro 4. Werrett (1997) entende que a eficácia de um banco de DNA é confirmada por esse tipo de saída, identificando que nos primeiros anos de funcionamento o banco do Reino Unido contava com 86.561 amostras biológicas, gerando 2.211 hits. Nos casos de violência sexual, isso implicou no auxílio a 24 inquéritos policiais, identificando oito ofensores. House et al. (2006) analisaram o potencial para aumentar a eficácia do banco de DNA canadense sob a perspectiva do número de identificações de criminosos a partir de hits, levando em conta o efeito de perfis de condenados registrados no banco. Os autores identificaram que no caso de criminosos sexuais, se o perfil de DNA destes fossem inseridos quando da condenação de seus crimes anteriores e de menor potencial ofensivo, aumentaria o número de identificações nos casos de ocorrência de crimes sexuais.

Quadro 4: Número de hits como indicador para medir a eficácia de bancos de DNA

Referência Objetivo Indicador Local
Walsh, Curran e Buckleton (2010) Sugere um modelo para medir o desempenho em bancos de dados de DNA. Nº de hits (correspondências confirmadas) Estados Unidos, Reino Unido, Nova Zelândia e
Canadá
Minervino et al. (2019) Analisa o desempenho através de Incremento de perfis de condenados no BNPG. Brasil
Boonderm et al. (2017) Analisa a eficácia do banco de DNA forense. Tailândia
House et al. (2006) Avalia a eficácia da Lei de Identificação de DNA, em casos de crimes sexuais. Canadá
Werrett (1997) Analisa o desempenho do banco de DNA, de casos gerais. Reino Unido
Carvalho et al. (2020) Avalia o potencial de um banco de dados estadual na resolução de crimes sexuais por meio da inserção de perfis obtidos a partir de evidências armazenadas e não testadas, relacionadas a agressões sexuais sem suspeita. Goiás, Brasil

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

No Brasil, Minervino et al. (2019) utilizaram essa medida para avaliar a eficácia do Projeto de Identificação de Perfis Genéticos de Condenados, relatando que com incrementos desses perfis no banco brasileiro, houve um aumento de mais 1.189% dessas amostras, levando a um aumento de 147% de hits. O estudo de Carvalho et al. (2020) avaliou o potencial de um banco de DNA a partir da amostra de 176 vestígios de crimes (um para cada caso), ocorridos no estado de Goiás, no Brasil, e que ainda não haviam sido lançados no banco de DNA. Eles identificaram que 32 daqueles perfis produziram 60 hits, contribuindo em 32 investigações em que ofensores foram identificados ou atribuídos como agressores sexuais em série, ao mesmo indivíduo. Assim, os autores identificaram uma taxa local de hits de 18,2%, mais alta que a taxa nacional de 10,5%. Contudo, eles ressaltaram que comparada a outros países, como Reino Unido e Estados Unidos, pode ser considerada uma taxa baixa, que também não pode ser comparada com outros trabalhos no Brasil por ausência de pesquisas com a mesma abordagem e critérios de investigação.

Um estudo em Mendoza, na Argentina, demonstrou que a mudança, em 2016, para um sistema de coleta e retenção mais amplo, implicou em um rápido crescimento do número de amostras genéticas no banco de DNA. Isso ocorreu porque além de condenados, a lei passou a permitir que também fossem adicionados na pesquisa criminal imputados por todos os tipos de crimes, prisioneiros, voluntários e forças policiais. Isso elevou para 13.821 amostras registradas em apenas um ano, na província de Mendoza, e no ano de 2018 a região contava, em seu banco de DNA, com um total de 40.652 indivíduos registrados. Por outro lado, havia apenas 289 amostras de evidências criminais, mas estas permitiram a ocorrência de 87 hits, contribuindo com o esclarecimento de 174 casos (LOCARNO; CORRADI; MARINO, 2019). Já na Tailândia, Boonderm et al. (2017) avaliaram que a introdução de um banco de DNA forense implicou na inserção de aproximadamente 130 mil perfis de indivíduos (presos e suspeitos), mais 14 mil perfis de vestígios criminais que permitiram cerca de 2 mil hits. Esses dois casos demonstram como bancos que inserem dados de ofensores criminais, além dos de condenados, contribuem para o aumento de hits.

Para Walsh, Curran e Buckleton (2010), o uso de hits é uma forma limitada de medição da eficácia, considerando que eles na verdade medem a produção em vez de resultados, mas dada a disponibilidade ampla desses registros, os hits permitem a elaboração de hipóteses sobre fatores que orientam ou restringem a eficácia de um banco de DNA.

A principal métrica utilizada no sistema CODIS refere-se ao número de “investigações auxiliadas”, como exposto no Quadro 5, capaz de medir seu desempenho em termos de eficácia (FBI, 2019). Logo, o número de hits seria uma medida-meio que colaboraria na quantidade de “investigações auxiliadas”. O mesmo entendimento tem a RIBPG (2019), que também utiliza o sistema CODIS, que em seu atual Manual de Procedimentos Operacionais, caracteriza o número de “investigações auxiliadas” como principal medida de resultados nos bancos de DNA no Brasil. Uma investigação é considerada auxiliada quando um hit contribui para identificar criminosos quando não havia suspeito, quando realiza ligações entre diferentes cenas de crime, ou quando auxilia na análise de padrões de crime identificando potenciais criminosos em série (CROUSE et al., 2019; AMANKWAA; MCCARTNEY, 2019).

Quadro 5: Número de investigações auxiliadas como indicador para medir a eficácia de bancos de DNA

Referência Objetivo Indicador Local
Ferreira et al. (2015) Analisa o desempenho do banco de DNA, em casos de crimes sexuais. Nº de investigações auxiliadas Distrito Federal, Brasil
Bittencourt e Iwamura (2019) Apresenta histórico do estabelecimento e evolução do BNPG, da RIBPG e discute a legislação relacionada. Brasil
Locarno, Corradi e Marino (2019) Demonstra o desempenho após implantação do banco de DNA. Mendoza, Argentina

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Nesse sentido, estudos brasileiros utilizaram o indicador de “investigações auxiliadas”. Ao analisar os vestígios biológicos em casos de agressão sexual, um dos estudos investigou, a partir dos dados do Instituto de Pesquisa de DNA Forense da Polícia Civil do Distrito Federal, um número de 78 estupradores em série que atacaram 223 mulheres em Brasília. Desses casos, 52 deles foram identificados, contribuindo com a investigação, e os outros 26 casos seguiam sob investigação (FERREIRA et al., 2015). Em outro estudo, foi levantado, a partir do Projeto de Identificação de Perfis Genéticos de Condenados, que existiam aproximadamente 137.600 condenados que aguardavam para serem identificados criminalmente por perfil genético (BITTENCOURT; IWAMURA, 2019). Em junho de 2019, o número armazenado no Banco Nacional de Perfis Genéticos (BNPG) era de apenas 17.361, mas estava em plena expansão, contando ainda com cerca de 9.000 perfis de vestígios, e já tinha auxiliado 825 investigações em crimes contra a vida, crimes sexuais e crime organizado. Os autores destacam que o aumento de inclusão de perfis genéticos no Brasil segue uma tendência mundial entre os laboratórios de DNA forenses.

Existe uma crítica por parte de Bell (2006), considerando que a medição da eficácia a partir do modelo em que as evidências são submetidas ao processo de confronto genético não consegue ultrapassar os limites do campo das ciências forenses, implicando em barreiras para fazer correlações entre casos vinculados ao tipo de crime ou quando vários serviços forenses estão relacionados. O autor propõe que o serviço forense e sua eficácia sejam medidos em relação ao percentual de casos resolvidos, levando em conta a quantidade de casos ocorridos, a quantidade de casos resolvidos e em quantos destes houve contribuição do serviço forense. Contudo, o autor tem ciência de que esta proposta se trata de um desafio aos laboratórios forenses, pois demandaria deles uma melhora na produção de dados limpos, abrangentes e integrados com outros sistemas de gerenciamento. Apesar dessa proposta, o autor não define o que seria considerado como um caso resolvido. Indicadores diversos podem ser identificados no Quadro 6.

Quadro 6: Outros indicadores quantitativos para medir a eficácia de bancos de DNA

Referência Objetivo Indicador Local
Bruenisholz et al. (2019) Análise de DNA e evidências de impressões digitais em infrações de roubo, comparando os processos forenses atuais e o desempenho. Nº de casos em que houve um hit (correspondência) de perfis e resultaram em uma prisão Austrália
Davis e Wells (2019) Examina casos de violência sexual para determinar a taxa de processos bem-sucedidos nos quais houve uma correspondência suspeita de DNA e o custo por condenação. Nº de casos em que houve um hit de perfis e resultaram em uma condenação Denver – CO, Estados Unidos
Crouse et al. (2019) Analisa os resultados do projeto The Initiative para pesquisar evidências de agressão sexual, armazenadas e não testadas nas agências policiais. Nº de casos em que houve um hit de perfis e resultaram em uma prisão ou condenação Palm Beach County – FL, Estados Unidos
Bell (2006) Discute medidas de atividade forense e sua relação com os resultados do crime como uma medida de eficácia forense. Nº de crimes resolvidos Victoria, Austrália
Bieber (2006) Melhorar a eficácia dos bancos de DNA forense. Estados Unidos
Gabriel, Boland e Holt (2010) Define formas de medir a eficácia em bancos de DNA.

Nº de hits entre perfis;

Nº de casos em que houve um hit de perfis e estão sendo, ou foram, resolvidos; e

Nº de crimes que deixaram de ocorrer por conta de uma identificação por DNA

San Francisco – CA, Estados Unidos

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Apesar de diversos estudos utilizarem o número de hits e o número de “investigações auxiliadas” para medir o sucesso de um banco de DNA, Bieber (2006) considera tais medidas insuficientes, pois os resultados não demonstram, geralmente, como essas investigações são auxiliadas sobre os resultados dos casos envolvidos ou se algum hit de fato resolveu o crime ocorrido. Para o autor, apesar de serem números interessantes, eles não conseguem fornecer uma imagem completa do desempenho geral de um banco de DNA. Além disso, os aspectos mencionados não têm sido abordados de forma sistemática por parte do sistema de justiça. Sem o monitoramento e a associação, a melhora da eficácia dos bancos de DNA não pode acontecer. Bieber (2006) entende que a melhor forma de medir a eficácia é mediante o acompanhamento de casos resolvidos, o que não significaria apenas identificar quantos foram condenados, mas quantos foram inocentados, o número de casos de reincidência, além dos criminosos transfronteiriços. Todos esses critérios mediriam então não apenas a eficácia dos laboratórios forenses, mas do sistema policial e do judicial.

Seguindo nesse sentido, Gabriel et al. (2010) também não consideram apenas o número de hits ou de “investigações auxiliadas” para medir a eficácia no uso do CODIS. Dessa forma, propuseram o uso de três fatores para medir os resultados a partir da utilização desse sistema. O primeiro refere-se ao quão significante é um hit para a investigação, ou seja, deve ser identificado que tipo de hit acontece, entre quais tipos de amostras e, ainda, o que gera na investigação criminal a partir deste hit. A segunda medida é em relação à progressão de casos e à resolução judicial, que significa o status em que a investigação ou o processo judicial se encontra. E o terceiro fator trata do quanto podem ser reduzidas as atividades criminosas futuras a partir de todo o processo de investigação e julgamento.

Estudos recentes têm tentado ir além do serviço pericial para medir a eficácia, analisando resultados a partir de prisões ou condenações geradas. Bruenisholz et al. (2019) examinaram o desempenho do serviço forense na Austrália, numa abordagem de ponta a ponta, como pode ser visto na Figura 3. Usaram, assim, uma taxa de prisão para determinar a eficácia, demonstrando que no ano de 2011, o uso da análise de DNA contribuiu numa taxa de prisão de 0,8% nos casos de roubo (67 prisões), e em 2015 essa taxa aumentou para 1,5% (111 prisões), em relação aos casos registrados.

Figura 3: Estágios analisados em avaliação ponta a ponta

Fonte: Elaborado pelos autores (2021) a partir de Bruenisholz et al. (2019).

Davis e Wells (2019) entendem que a eficácia dos bancos de DNA e do sistema CODIS não é maior porque, entre outros fatores, muitos vestígios biológicos não são testados, como nos casos de agressão sexual. Assim, os autores questionam se “dada uma correspondência do CODIS, que informações disponíveis, no momento em que uma investigação arquivada é reaberta, prediz se um caso resultará em condenação?” (DAVIS; WELLS, 2019, p. 46). Dessa forma, a medida usada para eficácia foi o número de criminosos condenados a partir de uma identificação genética. O resultado foi que dos 97 casos incluídos no estudo e que houve hit, em Denver, nos Estados Unidos, 48 implicaram em condenação; para os demais casos não houve prosseguimento com o processo, sendo os principais fatores de declínio a falta de cooperação da vítima ou da testemunha e razões não apresentadas pela promotoria.

Estudo similar foi realizado por Crouse et al. (2019), no Condado de Palm Beach, nos Estados Unidos, para o projeto The Initiative, iniciado em 2015, que analisou 1.558 casos, com mais de 5.000 vestígios de crimes sexuais referente aos anos de 1973 a 2016. De 1.558 vestígios de crimes sexuais não testados, 44% deles estavam aptos a serem analisados via CODIS, resultando em 261 hits, com a participação de 20 bancos de DNA do país, levando a 257 “investigações auxiliadas”. Em junho de 2019, essas investigações que estavam arquivadas tinham contribuído, a partir do projeto, com nove prisões, sendo uma delas uma condenação. O custo final do The Initiative foi de US$ 1,03 milhão.

Os resultados dos trabalhos de Carvalho et al. (2020), Ferreira et al. (2015) e Davis e Wells (2019) indicam que os bancos de DNA têm sido eficazes para os crimes de violência sexual, entretanto para outras naturezas de crimes ainda existem poucos estudos com análises específicas, ou ainda os crimes são tratados de forma generalizada (crimes totais). E ainda sobre os crimes de violência sexuais, mesmo que os estudos mencionados utilizem métricas diferentes – hits, investigações auxiliadas e condenações, respectivamente – é preciso destacar que os resultados representam significados diversos para o conceito de eficácia, aplicada aos bancos de DNA forense.

Em relação à nomenclatura de métricas apresentadas até aqui, existem certos conceitos que precisam ser melhor discutidos e até mesmo padronizados para avaliações comparativas futuras. O entendimento de ora hit e match serem termos equivalentes ora serem termos diferentes, apesar de ter uma prevalência de trabalhos que fazem essa diferença, em análises globais pode gerar inconsistências, tanto em termos conceituais quanto em quantitativos; dessa forma, instituições e grupos internacionais para estudos de DNA forense possuem a legitimidade para melhor conceituar tais diferenças. Assim como os conceitos de investigação auxiliada e casos resolvidos, a depender do contexto, também às vezes podem ser entendidos como equivalentes. Apesar da investigação auxiliada ser um conceito objetivamente definido, o entendimento de casos resolvidos pode significar que uma investigação policial foi auxiliada pelo uso de confronto genético, mas também pode significar que a denúncia foi feita pelo Ministério Público, ou ainda que houve uma prisão (preventiva ou condenatória). Essa situação, leva a diferentes resultados de análise.

Indo além da abordagem quantitativa, a partir da revisão, outros indicadores qualitativos têm sido retratados nas pesquisas do campo, compondo assim dimensões diversas sobre a eficácia dos bancos de DNA forense. Nos artigos de revisão do Quadro 7, identificou-se uma categorização dos critérios para medir a eficácia dos bancos de DNA. Na revisão de Struyf et al. (2019), os autores categorizaram o estudo da eficácia quanto ao objetivo e ao conteúdo, identificando que as abordagens encontradas se relacionavam aos efeitos de:

a) detecção e depuração: refere-se a como o uso da tipagem por DNA contribui para a identificação de suspeitos ou a exclusão de crimes. Para isso, os autores perceberam que eram utilizadas medidas como taxa de identificação, taxa de prisão, taxa de acusação e taxa de condenação;

b) dissuasão: refere-se ao potencial de impedir crimes futuros; utilizada tanto em relação à redução de reincidência do indivíduo quanto em nível agregado, contando com a redução dos crimes a partir da taxa de criminalidade; e

c) conhecimento científico criminológico: a eficácia pode ser vista a partir da contribuição, de forma complementar, aos estudos criminológicos, contudo os autores não declaram como isso ocorreria ou quais tipos de métodos seriam utilizados.

Quadro 7: Indicadores qualitativos para medir a eficácia de bancos de DNA

Referência Objetivo Indicador Local
Struyf et al. (2019) Fornece uma visão geral das pesquisas mais relevantes sobre a eficácia dos bancos de dados de DNA forense e sintetiza os resultados.

1. Como uma ferramenta de detecção e liberação para policiais e promotores:

taxa de identificação;

taxa de prisão;

taxa de acusação e acusação; e

taxa de condenação.

2. Como dissuasão:

taxa de reincidência; e

taxa de criminalidade.

3. Como fonte de dados para pesquisa criminológica.

Sem limitação geográfica
Amankwaa e McCartney (2019) Examina os esforços para medir a eficácia dos bancos de dados de DNA forense.

1. Capacidade de resolução de crimes;

2. Efeito de incapacidade;

3. Efeito de dissuasão;

4. Proteção de privacidade;

5. Legitimidade;

6. Eficiência de implementação; e

7. Custo de implementação.

Reino Unido

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Já na revisão de Amankwaa e McCartney (2019), para avaliar a eficácia do banco de DNA do Reino Unido, os autores identificaram na literatura sete resultados ou indicadores pelos quais esse tipo de banco tem sido avaliado. Com esse levantamento, utilizando da abordagem qualitativa, contribuíram para futuras pesquisas sobre a eficácia de bancos de DNA para métodos mistos, pois elencaram dimensões com efeitos e características diversas. O primeiro aspecto refere-se à capacidade de resolução de crimes, medindo quanto o banco genético ajuda os funcionários da justiça criminal na resolução de casos, levando em conta as taxas de condenação, a contribuição dos hits na eliminação de suspeitos e na ligação de crimes. O efeito de incapacidade foi outra abordagem identificada pelos autores, pois trata-se do potencial do banco de DNA em reduzir a criminalidade por intermédio da incapacitação dos infratores, sendo medido a partir das taxas de criminalidade. Contudo, os autores mencionam que operacionalmente é algo difícil de se mensurar, visto que são informações difíceis de se relacionar com dados de crimes, mas que ainda o impacto da taxa de criminalidade envolve outras variáveis socioeconômicas. Ainda identificaram o efeito dissuasor, que se refere ao potencial preventivo do banco de DNA através do impedimento de que indivíduos cometam crimes.

Aspectos mais subjetivos também foram relacionados por Amankwaa e McCartney (2019) como formas de determinar a eficácia dos bancos genéticos, como a proteção de privacidade, referindo-se a quão bem um banco de DNA protege a privacidade genética das pessoas. Contudo, os autores não demonstram como isso seria operacionalizado. E ainda quanto à legitimidade, no sentido de identificar a conformidade do sistema da base de dados com o princípio da proporcionalidade, mas também não revelando como pode ser operacionalizado.

Outros aspectos foram entendidos por esses autores como formas de medir a eficácia nos bancos de DNA forense, como a eficiência de implementação, referindo-se a quanto tempo e recurso não monetário são essenciais para implementar o sistema de banco de dados. E também o custo de implementação, entendido como o quanto de entradas financeiras são necessárias para implementar o sistema de banco de dados. Apesar de Amankwaa e McCartney (2019) considerarem os dois últimos aspectos como formas de medir a eficácia, identifica-se aqui que estes demonstram estar relacionados mais ao conceito de eficiência do que necessariamente de eficácia.

CONCLUSÕES, LIMITAÇÕES E AGENDA DE PESQUISA

A partir da presente revisão sistemática, foi possível identificar que diversos indicadores têm sido usados para medir a eficácia dos bancos de perfis genéticos. No ambiente micro, relativo aos laboratórios forenses, os indicadores estão relacionados às saídas do processo de confronto genético, ou seja, a quantidade de matches, hits ou investigações auxiliadas. Já em um ambiente mais amplo, levando em conta os subsistemas policial e judicial, os indicadores estavam relacionados a quantidade de casos resolvidos, indivíduos presos ou condenados.

Vale ressaltar que esta revisão ficou limitada à investigação de apenas três bases de periódicos, assim como fez uso também de apenas manuais operacionais e de recomendações de três instituições policiais. Outra limitação foi o idioma, sendo analisados apenas os artigos em língua inglesa. Desse modo, é possível que artigos relevantes, que tratem da mesma temática, não tenham sido identificados e incluídos na análise em função das limitações descritas.

Pode-se dizer que a eficácia em bancos de DNA é um tema em voga que vem sendo tratado a partir do Reino Unido desde a década de 1990. As pesquisas ganharam mais expressividade após a criação do CODIS, pelo FBI, elevando o interesse do tema ao longo dos anos 2000. Contudo, nos países em desenvolvimento, devido à adesão da ferramenta a partir da década de 2010, o tema vem crescendo nas publicações de nível internacional, ou seja, em língua inglesa.

Quanto aos métodos e às técnicas de pesquisas, os resultados demonstram, em sua maioria, que foi utilizado o método quantitativo, com aplicação de estatística descritiva, para os artigos empíricos, revelando que houve pouco desenvolvimento para modelos de análises mais complexos e com resultados robustos. Entre todos os artigos, apenas Davis e Wells (2019) utilizaram a análise multivariada de dados, com aplicação de regressão logística a partir de um modelo macro, que levou em conta tanto o serviço pericial quanto o da Justiça Criminal. Bruenisholz et al. (2019) também fizeram uso de um modelo macro, apesar de utilizarem apenas a estatística descritiva. Observando essas duas referências, identificou-se uma necessidade para elaborar modelos de análise com diversas variáveis envolvidas e com relações mais complexas. Entretanto, como ocorreu nesses dois artigos, para medir a eficácia dos bancos de DNA é preciso ir além do âmbito policial, de forma que sejam acompanhados os casos a partir de seu registro até o trânsito em julgado. Assim, permitiria maiores critérios na avaliação dos serviços públicos relacionados, bem como seus benefícios.

Em relação aos artigos de revisão, apenas um deles utilizou a revisão sistemática, mais criteriosa. Identifica-se aqui uma lacuna para mais revisões desse tipo, que contribuiria para maior diversidade de categorias na formação de construtos ou no desenvolvimento destes. Outra lacuna que este tipo de pesquisa poderia ocupar é no processo de legitimação do conceito de eficácia aplicada a bancos de DNA forenses. Foi possível perceber também que os conceitos de determinados indicadores tiveram de ser padronizados ao longo do tempo. Nos primeiros 10 anos de publicações de todos os documentos verificados, houve uma certa dificuldade em determinar a diferença entre match e hit. Esta situação parece ter sido pacificada após a definição do Manual de Procedimentos do FBI (FBI, 2019) e com as publicações mais recentes.

Com esta revisão, percebe-se uma tendência voltada para os estudos que examinem a eficácia como uma entre as várias medidas que compõem o desempenho e que levem em conta a análise num macro ambiente. Contudo, é importante ressaltar que, antes disso, é preciso que os inputs, outputs e outcomes do microambiente pericial sejam padronizados e regularmente coletados, permitindo medir a eficácia a partir de cortes transversais, inclusive para comparação entre países, um problema identificado no Sistema Prüm por Santos e Machado (2017).

Outra tendência e inevitável a ser tratada refere-se ao uso do “confronto genético” em associação à genealogia em alguns países, como Reino Unido e Estados Unidos (MENNELL; SHAW, 2006; WICKENHEISER, 2019). Isso implica em futuras discussões mais aprofundadas sobre o uso de busca familiar e de autorizações judiciais para uso de bancos de ancestralidade, entrando em conflito o interesse público e a privacidade genética.

Em face dessas descobertas, sugere-se uma agenda de pesquisa com enfoque em estudos que envolvam aplicação de modelos inferenciais para medir a eficácia em bancos de DNA forense, levando em conta os efeitos diretos e indiretos. Nesse sentido, propõe-se o teste de hipóteses com variáveis que estejam relacionadas ao processo de confronto genético e que impactem no serviço de investigação, como:

H1: o aumento do número de perfis de vestígios tem efeito positivo no número de hits;

H2: o aumento do número de perfis de condenados tem efeito positivo no número de hits;

H3: o aumento do número de perfis de suspeitos tem efeito positivo no número de hits;

H4: o aumento do número de perfis de vestígios, mediados por hits, tem efeito positivo no número de investigações auxiliadas;

H5: o aumento do número de perfis de condenados mediados por hits tem efeito positivo no número de investigações auxiliadas;

H6: o aumento do número de perfis de suspeitos mediados por hits tem efeito positivo no número de investigações auxiliadas.

Propõe-se também a criação de um modelo estatístico de análise de desempenho que envolva os ambientes policial e judicial, relacionado ao uso da técnica de confronto genético. Dessa forma, o construto seria formado pelas seguintes hipóteses:

H7: a ocorrência de hit entre perfis aumenta a probabilidade de resultar em uma prisão;

H8: a ocorrência de hit entre perfis aumenta a probabilidade de resultar em uma denúncia;

H9: a ocorrência de hit entre perfis aumenta a probabilidade de resultar em uma condenação.

E, por fim, sugere-se que sejam realizadas análises comparativas da eficácia em contextos de países diversos, respeitando as diferenças de tradição e estruturas das respectivas Justiças e processos de investigação criminal, na busca da validação de construtos relacionados a estes. Dessa forma, poderiam ser identificadas diferenças entre os bancos forenses em nível global ou entre determinados países.

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  1. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001. This study was financed in part by the Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Finance Code 001.↩︎