NECROPOLÍTICA: AÇÕES DO PODER JUDICIÁRIO GOIANO PARA TUTELAR A POPULAÇÃO CARCERÁRIA DO COMPLEXO PRISIONAL DE APARECIDA DE GOIÂNIA-GO DURANTE A COVID-19 NO ANO DE 2020
Gaspar Alexandre Machado de Sousa
Doutor em Sociologia e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Goiás. Professor Associado na Universidade Federal de Goiás. Professor Colaborador do Programa de Pós-Graduação em Direito e Políticas Públicas da Universidade Federal de Goiás (PPGDP-UFG). Professor na PUC Goiás. Membro do Conselho Penitenciário do Estado de Goiás.
País: Brasil Estado: Goiás Cidade: Goiânia
Email: gaspar@ufg.br ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5652-571X
Rafaela Félix dos Santos
Graduada em Direito pela Universidade Federal de Goiás, pós-graduada em Processo Penal pelo Cei Acadêmico, Servidora Pública Estadual.
País: Brasil Estado: Goiás Cidade: Goiânia
Email: rafaelafelix99@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7289-1664
Contribuições dos autores:
Rafaela Félix dos Santos contribuiu substancialmente para a concepção e planejamento do projeto, obtenção de dados ou análise e interpretação dos dados. Gaspar Alexandre Machado de Sousa contribuiu significativamente na elaboração do rascunho ou na revisão crítica do conteúdo e participou da aprovação da versão final do manuscrito.
RESUMO
A pesquisa tem como objetivo explorar a teoria da necropolítica na perspectiva da gestão do sistema carcerário, em especial acerca das medidas tomadas pelo Poder Judiciário Goiano que visam tutelar a população carcerária do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia-GO da contaminação em massa pela Covid-19. Diante desse problema, foi realizada uma pesquisa empírica acerca da adoção (ou não) de uma política criminal efetiva, analisando as decisões proferidas em sede de pedidos de antecipação de progressão de regime e livramento condicional, para pessoas que cumprem pena em regime fechado, bem como de pedidos de concessão da prisão domiciliar.
Palavras-chaves: Necropolítica. Cárcere. Coronavírus. Encarceramento. Saúde.
ABSTRACT
NECROPOLITICS: ACTIONS BY THE GOIANO JUDICIAL POWER TO GUARD THE PRISON POPULATION OF THE APARECIDA DE GOIÂNIA-GO PRISON COMPLEX DURING COVID-19 IN 2020
The research aims to explore the theory of necropolitics from the perspective of the management of the prison system, in particular about the measures taken by the Goiás Judiciary Branch that aim to protect the prison population of the Prison Complex of Aparecida de Goiânia-GO from mass contamination by Covid- 19. Faced with this problem, an empirical research was carried out on the adoption (or not) of an effective criminal policy, analyzing the decisions rendered in the context of requests for early regime progression and parole, for people serving sentence in a closed regime, as well such as requests for the grant of house arrest.
Keywords: Necropolitics. Prison. Coronavirus. Incarceration. Health.
Data de Recebimento: 22/11/2021 – Data de Aprovação: 13/12/2022
DOI: 10.31060/rbsp.2023.v17.n2.1631
INTRODUÇÃO
O termo necropolítica foi projetado pelo filósofo camaronês Achille Mbembe, que em sua obra Necropolítica (2018, p. 5) estabelece como pressuposto “que a expressão máxima da soberania reside em grande medida, no poder e na capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer”, destacando que a soberania, contemporaneamente, se expressa na instrumentalização da existência humana e do extermínio de corpos e populações para expressão do poder e manutenção do status quo, selecionando aqueles que seriam descartáveis.
A necropolítica relaciona o poder e a morte de forma profunda, explora como o poder apropria-se da morte como um objeto de gestão nas colônias e, consequentemente, nos países de tradição colonial. Em sua obra, Mbembe (2018, p. 5) destaca que a soberania é exercida através do controle sobre a mortalidade. Segundo o filósofo camaronês, aqueles que exercem o poder instrumentalizam a morte, escolhem quem deve viver, quem deve morrer e como dar-se-á essa morte.
O exercício da necropolítica enquanto forma de gestão nasce embrionariamente a partir do conceito de biopoder de Michel Foucault – o domínio da vida sobre o que o poder estabelece pelo controle – Mbembe, no entanto, acredita que o conceito de biopoder não é capaz de responder às questões acerca do exercício da soberania nos dias atuais, baseando seu ensaio numa ligação entre biopoder, noções de soberania e estado de exceção, para explicar a “instrumentalização generalizada da existência humana e a destruição material de corpos humanos e populações” (MBEMBE, 2018, p. 10).
Segundo o professor Vladimir Safatle (2020), o exercício do poder soberano na necropolítica explora a decisão sobre a morte e o extermínio de corpos, não apenas o poder como gestão de vida. Dessa forma, a necropolítica difere da biopolítica, pois aquela diz respeito não apenas ao exercício do poder sobre a vida e os corpos, como também à criação de mecanismos de eliminação de pessoas (ou grupo de pessoas) pelo Estado.
Assim, a morte provocada pela necropolítica não significa necessariamente uma morte biológica, mas, também, uma morte em vida, lenta e gradual, através da criação de mecanismos e de políticas de tortura e de privações, ou até mesmo na ausência [e impactos] de políticas públicas para tutelar minimamente os vulneráveis.
Morte e liberdade estão irrevogavelmente entrelaçadas. O terror é uma característica que define tanto os Estados escravistas quanto os regimes [que] são também instâncias e experiências específicas de ausência de liberdade. Viver sob a ocupação contemporânea é experimentar uma condição permanente de ‘viver da dor’. (MBEMBE, 2018, p. 68-69).
Através do ensaio de Mbembe (2018), pode-se dizer que duas coisas caracterizam a necropolítica: a escolha de um inimigo interno e a produção de sua morte, e a gestão de condições mortíferas. Isto é, o exercício da soberania para produção da morte de determinados corpos indesejáveis e a criação de condições para que a morte desses corpos perpetue-se de forma permanente, em um estado de exceção como regra.1
Situações de extrema pobreza, a evasão escolar e o descaso com a saúde de mulheres negras são fatores que atuam em conjunto com o sistema prisional e explicita esse mecanismo mortífero estruturado pelo Estado (MOREIRA; NASCIMENTO, 2018, p. 5).
Assim, a questão criminal, fundamentalmente, – bem como todo ordenamento jurídico – se mostra como um mecanismo de controle e ordem social necessário para a legitimação do capitalismo e de suas contradições. As contradições, por sua vez, se acentuam em momentos de crises e calamidades, como a pandemia causada pelo novo coronavírus.
Com isso, mudanças são desencadeadas no campo da política penal; o sistema neoliberal legitima traços bárbaros e destrutivos que ameaçam de forma gritante uma parcela da população. Parcela esta que historicamente vive marginalizada e negligenciada, afinal, segundo os dados dos Anuários de Segurança Pública, a população carcerária quase dobrou nos últimos 10 anos, saltando de 417.112 (FBSP, 2009) para 748.009 (FBSP, 2019).
Shimizu (2020, p. 11) aponta que em abril de 2020, em uma semana, aumentaram em 1.300 os casos de infecção pelo novo coronavírus no sistema prisional brasileiro, apesar da subnotificação dos casos e da precária testagem nas unidades prisionais, a infecção no cárcere seria muito superior se comparada à população em geral.
Esses mecanismos de produção da morte em massa também podem ser observados na chamada guerra às drogas, que legitima o boom do encarceramento brasileiro e que não delimita, de forma precisa, a figura do traficante, pois quem acaba fazendo a distinção entre usuário e traficante é a polícia nas ruas. E toda condução do procedimento revela instituições racistas (MOREIRA; NASCIMENTO, 2018, p. 6):
De acordo com dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias de Junho de 2016 (INFOPEN), as pessoas privadas de liberdade aumentaram de 401,2 mil em 2006, momento em que é sancionada a Lei 11.343/06 para 726,7 mil em 2016, ou seja, houve um aumento de mais de 300 mil pessoas em 10 anos da lei de drogas, população essa majoritariamente jovem (55%) e negra (64%) no sistema prisional. Esse aumento pode ser encarado como reflexo da política de encarceramento em massa legitimada pela nova lei de drogas. (MOREIRA; NASCIMENTO, 2018, p. 6).
Em Goiás, os dados são alarmantes: segundo o Anuário de Segurança Pública do ano de 2020, em 2019 somavam 25.761 pessoas presas para 14.108 vagas, ou seja, 182% de lotação no sistema carcerário goiano (FBSP, 2020). Ou seja, o judiciário tem encarcerado mais pessoas do que as penitenciárias conseguem suportar, vivendo a população encarcerada em uma aglomeração intermitente.
Ao mesmo tempo em que o Estado tenta manter os “indesejáveis” fora do seio social e aumenta o número de pessoas encarceradas, o mundo é assolado com um evento jamais vivido: a pandemia causada pelo novo coronavírus.
O presente trabalho tem por objetivo explorar qual a política criminal adotada pelo Poder Judiciário para tutela da população carcerária durante a pandemia causada pela Covid-19 que evitasse a contaminação em massa das pessoas reclusas no complexo prisional de Aparecida de Goiânia-GO, em cumprimento de pena em regime fechado, sob o foco do necessário desencarceramento para barrar a contaminação pela Covid-19 no ambiente carcerário; e como essa política se relaciona com a teoria da necropolítica enquanto forma de gestão.
O método adotado é hipotético-dedutivo para aferir, através de uma dialética-argumentativa e por meio de levantamento de dados, a seguinte hipótese de pesquisa: há reflexos da necropolítica na gestão do sistema prisional do Complexo de Aparecida de Goiânia-GO.
Inicialmente, para a construção argumentativa do presente trabalho, são analisados atos e decisões paradigmáticas no âmbito nacional. Em seguida, é realizada uma análise detida dos reflexos (ou não) da necropolítica no sistema carcerário. Para isso, procede-se à análise das decisões da 1ª Vara de Execução Penal da Comarca de Goiânia (competente para processar penas de reclusão em regime fechado, onde a titular é corregedora dos presídios estaduais).
A partir dessa análise, desenvolvida a partir de uma abordagem qualitativa, é possível verificar, de maneira mais assertiva, se as recomendações de desencarceramento foram efetivadas no Estado de Goiás, com a coleta de decisões acerca de pedidos de prisão domiciliar, antecipação da progressão de regime e antecipação do livramento condicional.
Para que fosse possível a coleta das decisões, optou-se por fazer um recorte, sendo analisadas apenas decisões que envolvem pessoas que cumprem pena privativa de liberdade (excluindo-se os presos provisórios, por isso a escolha da 1ª VEP), durante os meses de abril, maio, junho, julho e agosto do ano de 2020. A coleta e a análise dos documentos se deram da maneira exposta a seguir.
De início, é importante apontar que o sistema prisional brasileiro foi declarado pelo Supremo Tribunal Federal como um Estado de coisas inconstitucional, ou seja, existe um quadro generalizado de violações de direitos e garantias fundamentais (BRASIL, 2015, p. 3).
No acórdão, a Suprema Corte afirma que essas violações massivas de direitos são em especial em relação à proibição da tortura, do tratamento desumano ou degradante e das sanções cruéis (previstas no art. 5°, incisos III e XLXII, “e”, da Constituição Federal), bem como em relação ao cumprimento de pena em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, idade e sexo do apenado, o respeito à integridade física e moral, a presunção de não culpabilidade e os direitos sociais à saúde, educação, alimentação apropriada e acesso à justiça (BRASIL, 2015, p. 25).
O Conselho Nacional de Justiça, em 17 de março de 2020, editou a Recomendação Nº 62/2020, que dava diversas orientações aos magistrados. Em seu art. 5°, a recomendação solicita que os magistrados com competência no âmbito da Execução Penal considerem as seguintes medidas:
I – concessão de saída antecipada dos regimes fechado e semiaberto, nos termos das diretrizes fixadas pela Súmula Vinculante no 56 do Supremo Tribunal Federal, sobretudo em relação às: a) mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até 12 anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência e demais pessoas presas que se enquadrem no grupo de risco; b) pessoas presas em estabelecimentos penais com ocupação superior à capacidade, que não disponham de equipe de saúde lotada no estabelecimento, sob ordem de interdição, com medidas cautelares determinadas por órgão de sistema de jurisdição internacional, ou que disponham de instalações que favoreçam a propagação do novo coronavírus;
II – alinhamento do cronograma de saídas temporárias ao plano de contingência previsto no artigo 9º da presente Recomendação, avaliando eventual necessidade de prorrogação do prazo de retorno ou adiamento do benefício, assegurado, no último caso, o reagendamento da saída temporária após o término do período de restrição sanitária;
III – concessão de prisão domiciliar em relação a todas as pessoas presas em cumprimento de pena em regime aberto e semiaberto, mediante condições a serem definidas pelo Juiz da execução;
IV – colocação em prisão domiciliar de pessoa presa com diagnóstico suspeito ou confirmado de Covid-19, mediante relatório da equipe de saúde, na ausência de espaço de isolamento adequado no estabelecimento penal;
V – suspensão temporária do dever de apresentação regular em juízo das pessoas em cumprimento de pena no regime aberto, prisão domiciliar, penas restritivas de direitos, suspensão da execução da pena (sursis) e livramento condicional, pelo prazo de noventa dias;
Parágrafo único. Em caso de adiamento da concessão do benefício da saída temporária, o ato deverá ser comunicado com máxima antecedência a presos e seus familiares, sendo-lhes informado, assim que possível, a data reagendada para o usufruto, considerando as orientações das autoridades sanitárias relativas aos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do novo coronavírus. (BRASIL, CNJ, 2020c, p. 7, grifo nosso).
Também em 2020, o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) entrou com um pedido liminar, dentro da ADPF Nº 347, com o intuito de reduzir a população carcerária diante da Covid-19, apontando que o desencarceramento é a principal medida para prevenção da contaminação em massa da população carcerária. O pedido do IDDD tem pontos principais: a liberdade condicional para idosos, a prisão domiciliar para as pessoas do grupo de risco, a substituição da privação de liberdade por medidas alternativas (para todos os presos provisórios e novos custodiados em flagrante por crimes sem violência ou grave ameaça), a progressão antecipada da pena e a progressão de regime para quem aguarda o exame criminológico (IDDD, 2020a, p. 7).
SHIMIZU (2020, p. 11) destaca que em 2020, em duas unidades prisionais do Rio de Janeiro, houve um aumento de 100% do número de mortos se comparado ao mesmo período no ano anterior.
O observatório Covid nas Prisões compilou alguns dos habeas corpus coletivos impetrados em favor da população carcerária durante o ano de 2020, citando 6 importantes remédios constitucionais que tinham o intuito de redução das pessoas presas, em especial aquelas que pertenciam ao grupo de risco à Covid-19 (BARROUIN, 2021, p. 32). No Rio de Janeiro foram impetrados três importantes habeas corpus, o primeiro impetrado pela Defensoria Pública da União, onde os pacientes eram pessoas que estavam presas exclusivamente pelo não pagamento das fianças, foi deferido pelo Superior Tribunal de Justiça e estendido para todo o território nacional (BRASIL, STJ, 2020a, p. 1-3).
Também no Rio de Janeiro, foi impetrado pela Defensoria Pública Estadual habeas corpus coletivo em prol das pessoas idosas, o qual foi deferido parcialmente e determinou que os juízes de primeira instância competentes avaliassem, no prazo de 10 dias, as prisões preventivas e temporárias impostas em caráter preventivo e temporário às pessoas idosas (BRASIL, STJ, 2020b p. 1). Além disso, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro impetrou habeas corpus coletivo em favor das pessoas com tuberculose, este teve sua liminar indeferida e também foi indeferido no mérito, sob a fundamentação de que deve ser analisada de forma individualizada a situação de cada preso com tuberculose (BRASIL, STF, 2020c, p. 91-92).
Por fim, no âmbito nacional, destaca-se o habeas corpus coletivo impetrado em prol das mulheres gestantes e lactantes perante o Supremo Tribunal Federal que, há alguns anos, deferiu pleito parecido proibindo a decretação de prisão preventiva às gestantes ou mulheres mães de crianças menores de 12 anos ou com deficiências (habeas corpus Nº 143.641), no entanto, dessa vez, em meio à crise global de uma pandemia, decidiu por indeferir o pleito para mulheres gestantes, em estado puerperal e lactantes (BRASIL, STF, 2020, p. 7).
Observa-se que de todas as decisões compiladas pelo observatório Covid nas Prisões, apenas aquele que tinha como pacientes pessoas que tiveram a liberdade provisória concedida mediante pagamento de fiança (e continuaram presas por não terem condições financeiras de adimplemento) foi deferido em sua totalidade (BARROUIN, 2021). Os demais remédios constitucionais movidos coletivamente em favor da população carcerária foram indeferidos, em sua maioria pelo empecilho colocado pelo Poder Judiciário de análise em demandas coletivas.
No estado de Goiás não foi diferente. A Defensoria Pública do Estado de Goiás moveu o habeas corpus coletivo Nº 571.796, que pugnava pela concessão do regime de prisão domiciliar a todos os presos do estado que estivessem nos regimes aberto e semiaberto e também para aqueles do regime fechado que faziam parte do grupo de risco ao novo coronavírus, bem como a antecipação da progressão de regime e o livramento condicional dos presos que atingissem os requisitos para esses benefícios nos próximos nove meses, que também foi negado pelo Superior Tribunal de Justiça, em decisão monocrática e em sede de agravo regimental, sob o fundamento de que não haviam informações suficientes acerca dos pacientes e da coação ilegal de manutenção da prisão (BRASIL, STJ, 2020d, p. 3).
Há resistência do Poder Judiciário em proferir decisões que visem o desencarceramento e o efetivo combate à superlotação carcerária, postura conservadora que delineia a não adoção de políticas criminais de tutela coletiva da população carcerária diante da Covid-19 e a possibilidade de verdadeiro massacre dessas pessoas que encontram-se em um Estado de coisas inconstitucional, vivenciando, há anos, constantes e massivas violações de direitos, em especial direito à saúde e a uma vida digna. Conforme apontado pelos boletins semanais do Conselho Nacional de Justiça (BRASIL, CNJ, 2021, p. 1), apesar da ideação de melhorias no ambiente carcerário e da fantasia de que o sistema prisional se torne menos inóspito, a situação do cárcere no Brasil é tão alarmante que apenas uma política séria de desencarceramento pode barrar a contaminação pelo novo coronavírus. No entanto, são colocados empecilhos para adoção dessa política de desencarceramento, conforme se observou das decisões dos mandamus coletivos, onde os tribunais superiores fundamentam que as iniciais são genéricas e não elucidam a situação de cada paciente (o que seria, verdadeiramente, impossível).
A seguir, passa-se à análise do enfrentamento desses pedidos individualizados, a fim de delinear quais são as diretrizes no âmbito estadual em relação à proteção da contaminação em massa pela Covid-19, pela perspectiva do necessário desencarceramento.
A pesquisa documental compreende um exame de diversos materiais que não sofreram trabalho de análise ou que podem ser reexaminados (os documentos) e tem por objetivo a extração de informações para compreensão de um determinado fenômeno (KRIPKA; SCHELLER; BONOTTO, 2014, p. 244).
Nessa perspectiva, a presente pesquisa é realizada exclusivamente através da análise documental, em um primeiro momento, de decisões da 1ª Vara de Execução Penal da Comarca de Goiânia-GO e, num segundo momento, dos atos administrativos da Diretoria Geral de Administração Penitenciária, para aferição de adoção (ou não) de política criminal que tutela a população carcerária frente à pandemia causada pela Covid-19, a fim de identificar (ou não) traços de uma estratégia mortífera para as pessoas presas no estado de Goiás.
Para esta análise, utiliza-se uma abordagem quantitativa das decisões, a fim de identificar qual a política criminal adotada pelo judiciário goiano frente à pandemia. Para análise das decisões do poder executivo, utiliza-se apenas a abordagem qualitativa, afinal, não são numerosos os atos. Castro, em seu artigo O método quantitativo na pesquisa em direito (2017), destaca que no Brasil existe uma carência de pesquisas quantitativas sobre o funcionamento das instituições do sistema de justiça, em contraste com uma excessiva judicialização de políticas públicas. Ou seja, há um histórico de massivas reformas legais e institucionais que têm uma base empírica insuficiente.
O banco de dados para análise das decisões foi realizado através de uma planilha no Excel, que foi dividida por abas de acordo com os pedidos: antecipação da progressão de regime e livramento condicional no 1° grau de jurisdição e pedidos de prisão domiciliar no 1° grau de jurisdição. A coleta foi realizada da forma que se passa a expor.
Quanto às decisões da 1ª Vara de Execução Penal da Comarca de Goiânia (1ª VEP), a coleta foi realizada através do campo “busca avançada” do Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU, 2020)2, selecionando-se a 1ª VEP e analisando todos os processos vinculados ao Juízo, que totalizam 3.084 (três mil e oitenta e quatro) processos.
Dentre esses, foram selecionados todos que possuem em seus bojos pedidos de antecipação da progressão de regime e concessão de prisão domiciliar, entre os meses de março, abril e maio de 2020, subtraindo-se os demais, restando, respectivamente, 476 e 111 pedidos a serem analisados.
Do universo de acórdãos encontrados, procedeu-se à coleta de dados e à alimentação de uma planilha com informações sobre o paciente, qual a comorbidade/qual tempo de antecipação, e, por fim, sobre o julgamento em segunda instância. Das decisões de 1º grau selecionadas também foram coletados os mesmos dados.
Assim, foram extraídas de cada decisão informações sobre o sexo dos apenados, escolaridade, profissão, idade, se os apenados são assistidos da Defensoria Pública, por núcleos de prática jurídica ou por advogados particulares, qual tempo de antecipação e fundamentações utilizadas para o deferimento/indeferimento dos pleitos.
Primeiramente, realiza-se uma análise do panorama dos dados obtidos, a fim de traçar um perfil socioeconômico daqueles que estão no cárcere, através do universo de decisões analisadas. Em seguida, são analisados dados gerais acerca do provimento dos pedidos, quantos pedidos ao todo foram deferidos/indeferidos e quais foram as principais razões de deferimento/indeferimento, para posteriormente concatenar os dados em uma análise minuciosa da correlação entre o perfil dos apenados, o teor dos pedidos e o teor dos provimentos.
Para fins de organização do trabalho, os dados são analisados com a separação do teor dos pedidos, examinando, inicialmente, os pedidos de prisão domiciliar e, em segundo lugar, os pedidos de antecipação da progressão de regime/livramento condicional.
A partir da análise desses recortes, é possível verificar a hipótese de reflexos da necropolítica no sistema carcerário goiano, a adoção (ou não) de uma política criminal voltada ao necessário desencarceramento ou a omissão do poder judiciário em relação ao tema.
Dados gerais
Inicialmente, cumpre ressaltar que dentro do universo pesquisado, 97% dos apenados são do sexo masculino e 3% do sexo feminino. Além disso, a média de idade das pessoas é de 33 anos, excluindo-se os idosos (pois 37 dos pedidos de prisão domiciliar foram feitos em prol das pessoas idosas, assim, caso somados para efeito de média, modificariam a realidade).
Ainda, apesar dos esforços empreendidos, não foi possível coletar vastos dados sociais acerca do perfil das pessoas presas, sendo que todos tiveram sua idade registrada, 112 não tiveram a escolaridade registrada e 43 não tiveram a profissão registrada.
Observa-se, com a coleta de dados, que em sua maioria os apenados são assistidos pela Defensoria Pública, o que demonstra hipossuficiência e situação socioeconômica de hipervulnerabilidade:
Gráfico 1: Representantes (Geral)
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
A Defensoria Pública, segundo a Lei Complementar 80/1994, é o órgão responsável pela orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados (BRASIL, 1994). Os necessitados, por sua vez, são definidos pelo inciso LXXIV, do art. 5°, da Constituição Federal, como aqueles que “apresentarem insuficiência de recursos” (BRASIL, 1988).
Outro aspecto importante do perfil socioeconômico dos apenados é revelado pelo nível de escolaridade, uma vez que de todo o universo pesquisado, apenas 1 pessoa tinha Ensino Superior completo, 1 tinha Ensino Técnico e, em sua maioria, os apenados não terminaram o ensino básico. Em alguns processos, mais especificamente em 42, a escolaridade foi colocada como “sabe ler e escrever”, o que não foi considerado para confecção do Gráfico 2, dada a incerteza acerca da escolaridade.
Gráfico 2: Escolaridade (Geral)
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
No Gráfico 2 foram condensadas as escolaridades que mais apareceram nos autos, não se incluindo: 1 pessoa com Ensino Superior completo, 2 com Ensino Superior incompleto, 1 com grau de Doutor, 1 com Ensino Técnico completo e as 41 que “sabe ler e escrever”. O fato de 412 pessoas de um universo de 587 não terem concluído o ensino básico revela a seletividade do sistema penal, revelando, ainda, o controle da população pobre através do cárcere.
No que tange às profissões, os dados não são diferentes: apesar de um universo maior, a maioria das profissões presentes são precarizadas, geralmente sem registro formal e mal remuneradas.
De acordo com Santos (2008, p. 468), o significado político do controle social realizado pelo Direito Penal e pelo sistema de justiça aparece, desse modo, nas funções reais desse ramo do Direito: a criminalização primária (ou abstrata) realizada pelo Direito Penal (definição legal de crimes e penas) e a criminalização secundária (ou concreta) realizada pelo sistema de justiça criminal, constituído pela polícia, justiça e prisão (aplicação e execução de penas criminais), garantem a existência e a reprodução da realidade social desigual das sociedades contemporâneas.
Desse modo, se a criminalização primária parece neutra, a criminalização secundária é diferenciada pela posição social dos sujeitos respectivos. Nessa medida, a proteção penal seletiva de bens jurídicos das classes e dos grupos sociais hegemônicos pré-seleciona os sujeitos estigmatizáveis pela sanção penal. Assim, a criminalidade sistêmica econômica e financeira de autores pertencentes aos grupos sociais hegemônicos não gera processos de criminalização, ou estes não geram consequências penais. Já a criminalidade individual violenta ou fraudulenta de autores dos segmentos sociais subalternos gera processos de criminalização com consequências penais de rigor punitivo progressivo, na relação direta das variáveis de subocupação, desocupação e marginalização do mercado de trabalho (SANTOS, 2008, p. 470).
Destaca-se que para confecção do Gráfico 3 selecionou-se as profissões que mais aparecem, desconsiderando 1 pessoa que era servidora pública, 1 gerente agropecuário, 1 babá, 1 músico, 1 gesseiro, 1 motoboy, 1 artesão, 1 agente de saúde, 1 aposentado, 4 sapateiros e 4 garçons. Uniu-se, também, algumas categorias, por exemplo, todas as profissões de nível técnico (técnico em informática, técnico de celular e técnico em segurança) e todos os auxiliares (auxiliar de limpeza, auxiliar de indústria, auxiliar de pintor, auxiliar de costura, auxiliar de olaria, auxiliar de banho e tosa etc.), para o condensamento dos dados obtidos e a viabilidade de construção do gráfico.
Assim, as profissões principais foram:
Gráfico 3: Profissões (Geral)
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
Há, ainda, uma porcentagem muito grande de pessoas que não tinham profissão no momento da prisão, constando como “desempregado”. As estratégias de criminalização do povo pobre e as duras políticas de controle social (tortura, ausência de direitos e garantias fundamentais, duras penas etc.) são necessárias ao neoliberalismo para a contenção das massas empobrecidas sem trabalho (BATISTA, 2011, p. 28).
O perfil socioeconômico levantado atesta aquilo que foi apontado anteriormente, isto é, que o avanço do neoliberalismo revela traços mortíferos para gestão da sociedade, em especial das massas empobrecidas e oprimidas, emparedando a vida dos indesejáveis, descartáveis, inimigos, para manutenção das grandes riquezas e concentração de capital. O cárcere, por sua vez, como dito, conta com péssimas condições de instalação, tratamento, respeito aos direitos fundamentais.
Em Goiás, as penitenciárias contam com uma lotação de 375% do número de vagas (VASCONCELOS, 2020)3, sendo que a superlotação não diz respeito apenas à ausência de espaço físico, mas a todo o aparato para condições dignas de vida, transparecendo no estado de Goiás, assim, a necropolítica através do emparedamento do povo pobre.
Inicialmente, são examinados aspectos gerais de forma quantitativa em relação aos casos e decisões: números de comorbidades nos pedidos de prisão domiciliar, quais as comorbidades que ensejaram os pedidos, quais os provimentos – com recorte de provimento por representação, por quantidade de comorbidades e por natureza das comorbidades. Em segundo lugar, são analisados os fundamentos das decisões, que se repetiram na maioria das decisões de indeferimento.
O cenário geral de número de comorbidades por apenado demonstra que a maioria (mais de 80%) sofre com apenas uma comorbidade, mais de 10% sofrem com duas comorbidades e menos de 5% sofrem com três ou mais comorbidades:
Gráfico 4: Número de comorbidades dos reeducandos que realizaram pedidos de prisão domiciliar
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
Dentre as comorbidades que foram identificadas nos pedidos de prisão domiciliar estão: cardiopatia, insuficiência renal, doenças respiratórias, hipertensão, diabetes, imunossupressão e tuberculose, além dos idosos que são considerados grupo de risco à Covid-19. Proporcionalmente, tuberculose foi a comorbidade mais prevalente nos pedidos, afinal, as penitenciárias brasileiras enfrentam a epidemia de tuberculose, atingindo 35 vezes mais pessoas presas do que pessoas em liberdade, além de ser uma doença que, ao encontro da Covid-19, é extremamente letal (MUNIZ; FONSECA, 2020).
Gráfico 5: Comorbidades nos pedidos de prisão domiciliar
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
Ainda, a incidência dos casos de tuberculose em pessoas negras é mais que o dobro dos casos entre pessoas brancas, sendo que em 2018: 66,15% dos casos de tuberculose ocorreram com pessoas negras, enquanto 25,2% com pessoas brancas, 7,1% ficaram sem informações e 1% entre amarelos e indígenas (MUNIZ; FONSECA, 2020). Além disso, segundo a Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT, 2017), a tuberculose é uma doença relacionada à extrema pobreza e às situações de vulnerabilidade. A Agência Pública destaca: “A superlotação é a condição ideal para qualquer agente biológico de transmissão área. A falta de insumos é outro fator: falta água e sabão para essas pessoas. E claro, faltam cuidados de saúde, atendimento de médicos, enfermeiros e equipe de assistência social” (MACHADO, 2020 apud MUNIZ; FONSECA, 2020).
Apesar de todos os riscos alertados para “o encontro” da Covid-19 com a epidemia de tuberculose e do fato das prisões com superlotação serem os ambientes mais propícios para propagação das duas doenças, o Juízo de execução não adotou nenhuma política criminal que visasse o desencarceramento e a tutela dos acometidos por tuberculose (bem como das demais pessoas, que podem facilmente se contaminarem, dada a situação epidemiológica citada). Pelo contrário, todos os pedidos de prisão domiciliar com base no acometimento do reeducando por tuberculose foram indeferidos, sendo que apenas 17% foram desencarcerados, afinal tiveram a domiciliar negada, mas o livramento condicional ou progressão de regime deferido.
Gráfico 6: Provimento por comorbidades nos pedidos de prisão domiciliar
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
Observa-se que a comorbidade que proporcionalmente teve mais relação com o deferimento da prisão domiciliar foi a insuficiência renal, que coincidentemente foi uma das comorbidades que menos incidiram na população carcerária aparecidense, conforme Gráfico 5. Ainda, todos os portadores de cardiopatia ou doenças respiratórias tiveram os pedidos de prisão domiciliar negados, enquanto os hipertensos tiveram 45% de deferimento, os imunossuprimidos 50% de deferimento e os idosos 17% de deferimento. O resultado geral foi de 84% de indeferimentos, 10% de deferimentos e 6% de casos em que não havia decisão no momento da obtenção dos dados.
Portanto, não foi adotada uma política voltada para o desencarceramento em relação às pessoas que possuem alguma comorbidade, o que explicita não apenas um descuido do Poder Judiciário em relação à população carcerária, mas uma verdadeira política de morte, já que, conforme mencionado, as condições do cárcere são perfeitas para a propagação da Covid-19, e o encontro da Covid com as demais comorbidades pode provocar uma letalidade catastrófica. Do universo de casos analisados, 3 pessoas que tiveram o pedido domiciliar indeferido morreram ainda no ano de 2020, vítimas da Covid-19.
Outro recorte realizado relacionou o número de deferimentos com os representantes legais que pleitearam os pedidos, momento em que constatou-se que, proporcionalmente, dos pedidos feitos pela Defensoria Pública do Estado de Goiás, o êxito foi de 5%, enquanto dos pedidos feitos por advogados, o êxito salta para mais de 20%:
Gráfico 7: Provimento por representante nos pedidos de prisão domiciliar
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
O Gráfico 7 demonstra que os pedidos formulados por advogados particulares tiveram maior número de deferimento (mais de 20%), enquanto menos de 10% dos pedidos formulados pela Defensoria Pública foram providos.
A considerável diferença entre o deferimento dos pedidos da Defensoria Pública e dos advogados demonstra que mesmo em situação de vulnerabilidade extrema (que é o cárcere), o tratamento para os pobres e necessitados é recrudescido, reflexo da necropolítica na atuação do Poder Judiciário que, diante do momento de calamidade pública vivida, verdadeiro Estado Suicidário, discrimina, mesmo que acidentalmente, aqueles que são mais vulneráveis.
Por fim, o último recorte realizado relaciona a quantidade de comorbidades em cada pessoa presa com o número de deferimentos/indeferimentos. Constata-se que quando há três ou mais comorbidades, o número de deferimentos em relação a apenas uma comorbidade é 45% superior, e 20% superior a duas ou mais comorbidades. Assim, os pedidos de prisão domiciliar em favor de pessoas com três ou mais comorbidades foram 50% deferidos e 50% indeferidos, enquanto os pedidos em favor de pessoas com duas ou mais comorbidades foram 70% indeferidos e 30% deferidos, os pedidos de pessoas com apenas uma comorbidade foram 80% indeferidos e 5% deferidos, e os demais ainda estão pendentes de julgamento:
Gráfico 8: Provimento por quantidade de comorbidades nos pedidos de prisão domiciliar
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
Quanto ao teor das decisões, é importante esclarecer que apesar das tentativas de calcular quantas vezes os mesmos parágrafos foram colocados nas decisões, a autora não obteve êxito na sistematização dos fundamentos, por isso, são analisados os principais fundamentos para o indeferimento.
Observa-se que o fundamento das decisões de indeferimento tinha quatro pontos principais: 1) a inexistência de registro de contágio pela Covid-19 no Complexo Prisional; 2) a inexistência de gravidade concreta da doença; 3) a possibilidade de tratamento da comorbidade em ambiente carcerário; e 4) a tomada de medidas de prevenção pela Diretoria-Geral de Administração Penitenciária.
A medida sanitária citada nas decisões é a transferência dos apenados maiores de 60 anos e portadores de doenças crônicas para a mesma unidade prisional, separando-os dos demais detentos, além da limitação de visitas dos familiares e advogados:
Em relação ao risco de contaminação pelo COVID-19, como fundamento para prisão domiciliar, tenho que a situação deve ser analisada com extrema cautela na execução penal. É certo que a pandemia do COVID-19 constitui situação grave e que merece ser tratada com total atenção e dedicação. Certa disso é que tomamos as providências urgentes na prevenção contida na Portaria nº 002/2020, que trata de medidas voltadas a evitar o contágio da população carcerária, notadamente aqueles sentenciados que se enquadram no grupo de risco de maior possibilidade de contágio da doença. Uma das principais medidas é a separação e transferência dos apenados maiores de 60 anos e os portadores de doenças crônicas para local mais apropriado, sendo preparado pela DGAP a Casa do Albergado, o Núcleo de Custódia e a Colônia Agrícola, para esta finalidade. Nesse sentido, não há que se falar na concessão de regime domiciliar somente amparado na expectativa de contaminação da população carcerária. Até porque TODAS AS PESSOAS estão à mercê dessa infeliz doença. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS, 2020a, p. 3).
O fundamento menciona que os pedidos não podem ser amparados na expectativa de contaminação, uma vez que todas as pessoas estão à mercê da contaminação. Questiona-se qual foi o impacto quando a Covid-19 chegou à referida unidade que concentrou todos os idosos e as pessoas do grupo de risco, mas o levantamento de dados por unidade prisional não foi possível. Ademais, o fundamento contraria diretamente a Recomendação Nº 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça, que, por sua vez, adotou uma política necessária de desencarceramento, recomendado aos magistrados a concessão de prisão domiciliar a todos aqueles que pertencem ao grupo de risco à Covid-19, afinal, a mera existência de comorbidade aumenta a letalidade da Covid-19, sendo desnecessária a extrema debilidade da pessoa.
Sobre o descumprimento da recomendação do Conselho Nacional de Justiça, o Juízo argumenta que se trata de mera orientação evocando o princípio do livre convencimento, argumentando que a pandemia não pode ser utilizada para colocar a sociedade em risco ainda maior:
Contudo, insta esclarecer que a Recomendação do CNJ teve somente o condão de orientação aos Magistrados, mas sem vincular sua atuação, que deve ser independente e pautada no livre convencimento motivado de caráter constitucional e legal, conforme inclusive reconhecido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que negou referendo a liminar deferida pelo Ministro Marco Aurélio nos autos da ADPF 347. Obviamente, a Pandemia pela COVID-19 mergulhou a todos em uma situação bastante excepcional, onde os direitos constitucionais dos presos e dos demais cidadãos devem ser bem contrabalanceados, haja vista que não existem direitos constitucionais absolutos, de forma que a pandemia do novo Corona vírus não pode ser utilizada para colocar a sociedade em risco ainda maior, já que se encontra tão fragilizada com as limitações de confinamento social impostas pelo Estado. O simples fato de se afirmar que o preso é portador de doenças graves e, em tratamento, não lhe assegura o direito de ficar recolhido em prisão domiciliar, pois a defesa não se desincumbiu de demonstrar, por meio de documentação idônea, a impossibilidade de receber o tratamento no estabelecimento prisional em que se encontra (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS, 2020b, p. 2).
Mesmo que houvesse possibilidade de tratamento no estabelecimento prisional, a maioria das condições das pessoas presas são permanentes ou epidemiológicas. Por exemplo, não há de se falar em tratamento para a condição de idoso, mesmo assim, ser idoso é pertencer ao grupo de risco à Covid-19, logo, uma vez contraído o vírus, a chance de letalidade é maior. Idêntico é o caso, por exemplo, da imunossupressão que, mesmo com o tratamento diário através dos coquetéis, não deixará de existir e ainda faz com que as pessoas sejam grupo de risco à Covid-19, assim também os diabéticos, hipertensos, cardiopatas, e acometidos de insuficiência renal crônica.
Uma evidência de que o ambiente carcerário não é capaz de tratar e prevenir determinadas patologias é a citada epidemia de tuberculose no ambiente carcerário, que de 2009 a 2018 aumentou o número de casos em quase 50% (MUNIZ; FONSECA, 2020).
Observa-se, portanto, no mínimo uma resistência do Poder Judiciário em adotar uma política criminal real de tutela das pessoas presas que pertencem ao grupo de risco à Covid-19, inexistindo qualquer esforço para o desencarceramento no crítico momento pandêmico.
Em relação aos pedidos de antecipação da progressão de regime e do livramento condicional, inicialmente, é realizada de forma quantitativa os recortes realizados: deferimentos, indeferimentos e pendentes de decisão; quantidade de deferimentos de forma antecipada e quantidade de deferimentos após o adimplemento dos requisitos objetivos e subjetivos; e proporcionalidade dos deferimentos entre os assistidos da Defensoria Pública e os representados por advogados particulares.
Inicialmente, cumpre esclarecer que o objeto de estudos foi a antecipação da progressão de regime e do livramento condicional justamente para se explorar a adoção (ou não) de uma política criminal voltada para o desencarceramento diante da pandemia causada pela Covid-19, afinal, se não fosse a antecipação, é dever do Juízo declarar a progressão de regime prisional.
Em relação ao número de provimentos/desprovimentos, do universo de pedidos analisados, 50% foram deferidos, 48% indeferidos e 3% ainda não foram julgados. No entanto, ao analisar as decisões de provimento dos pedidos de antecipação da progressão de regime e do livramento condicional, observa-se que, apesar do pedido ter a antecipação como objeto, a maioria das decisões de provimento só foram proferidas após o adimplemento do requisito objetivo, sendo que do universo de 50% de deferimento da progressão/livramento condicional, 49% foram deferidos após o adimplemento dos lapsos temporais previstos na Lei de Execução Penal:
Gráfico 9: Provimento em pedidos de Livramento Condicional e Progressão
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
Gráfico 10: Momento do provimento nos pedidos de Livramento Condicional ou Progressão
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
Semelhante aos pedidos de concessão da prisão domiciliar, ao elaborar o banco de dados, a autora tentou sistematizar os fundamentos dos pedidos de indeferimento, no entanto, na hora da análise não foi possível a realização de uma análise quantitativa dos principais fundamentos. No entanto, os indeferimentos tiveram duas principais razões: 1) não preenchimento do requisito objetivo; e 2) não preenchimento do requisito subjetivo.
A Lei de Execução Penal observa (ou deveria observar) o princípio da progressividade da pena, fixando alguns requisitos para progressão de regime em seu art. 112, os requisitos são de ordem objetiva (cumprir uma fração da pena) e subjetiva (ter bom comportamento carcerário) (BRASIL, 1984).
Antes da publicação da Lei Nº 13.964/2019, as frações necessárias para concessão da progressão de regime era de 1/6 para a prática de crimes de natureza comum, 2/5 para a prática de crimes hediondos quando o condenado era primário, e 3/5 para a prática de crimes hediondos quando o condenado era reincidente (BRASIL, 1984). Observa-se que o pacote anticrime dificultou a progressão de regime, aumentando as frações necessárias e criando outras categorias.
Em relação ao requisito objetivo, constata-se que a antecipação da progressão de regime/livramento condicional foi significativa apenas para aqueles que alcançariam o lapso temporal nos próximos 3 meses, ou seja, foram deferidos aqueles que estavam na iminência de alcançar o lapso temporal necessário para declaração da progressão de regime. 74% dos pedidos foram deferidos após o adimplemento do requisito objetivo. Enquanto o deferimento da antecipação em até um mês foi de 80%, de um a três meses foi de 79%, de seis meses a um ano foi de 5%, e todos os pedidos que tinham por objeto a antecipação acima de um ano foram indeferidos:
Gráfico 11: Provimento por tempo de antecipação
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
A boa conduta carcerária, por sua vez, é atestada pela administração penitenciária. No estado de Goiás, o comportamento carcerário é regulamentado pela Portaria Nº 492/2018, que dispõe que o conceito regular é o conceito inicial de comportamento, quando se adentra a Unidade Prisional, bem como o conceito intermediário entre o “mau” e o “bom” após cometimento da falta disciplinar. Após adentrar a unidade prisional, a pessoa deve permanecer no mínimo 2 anos sem cometer qualquer infração disciplinar para que receba o conceito bom.
Praticada falta disciplinar de natureza leve, o tempo de reabilitação do comportamento, do mau para o regular, é de 6 meses, do regular para o bom, mais 6 meses. Assim, praticada falta disciplinar de natureza leve, para que o condenado ostente bom comportamento carcerário novamente, o prazo é de 1 ano. Para as faltas disciplinares de natureza média, o tempo de reabilitação do comportamento para o bom é de 2 anos, enquanto para as faltas disciplinares de natureza grave, o tempo necessário para a reabilitação é de 4 anos (GOIÁS, 2018, p. 13).
Observa-se que a Portaria Nº 492/2018 não faz nenhuma menção à diferenciação entre faltas disciplinares, não leva em consideração o histórico do cumprimento da pena, qual o remanescente da pena, o caráter do delito ou a gravidade concreta da falta disciplinar. Dessa maneira, quem, por exemplo, comete um homicídio no interior do sistema carcerário, tem o mesmo tempo de reabilitação para o comportamento de quem é encontrado sob a posse de um celular. A portaria desrespeita, assim, o princípio da individualização da pena, preconizado no art. 5°, inciso XLVI, da Constituição Federal (BRASIL, 1988).
Além do desrespeito ao princípio da individualização da pena, a disposição, em especial no que diz respeito às faltas disciplinares de natureza grave, desrespeita o princípio da proporcionalidade e razoabilidade, já que o lapso temporal para reabilitação do comportamento é demasiadamente longo, isso se comparado à própria normativa federal que trata do mesmo assunto, afinal, o Decreto Nº 6.049/2007, que regulamenta as penitenciárias federais, estabelece o prazo de 1 ano para reabilitação do comportamento no cometimento de falta disciplinar de natureza grave (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2007).
Em relação ao requisito subjetivo, em alguns casos, há flexibilização para até um ano após o cometimento da falta disciplinar. No entanto, não se vislumbra qualquer isonomia entre os deferimentos e os indeferimentos nesses casos, pois, conforme constatada, a proporção entre o deferimento para aqueles que tinham o conceito “mau” era maior do que aos que possuíam o conceito “regular”, tanto para os que já tinham alcançado o requisito objetivo quanto em relação à antecipação:
Gráfico 12: Provimento por critério subjetivo
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
Como mencionado, o conceito regular de comportamento é o conceito inicial (quando a pessoa adentra ao cárcere e não cometeu nenhuma falta disciplinar) ou intermediário, entre o mau e o bom, assim, ter um comportamento regular indica uma conduta carcerária melhor do que o mau comportamento ou, pelo menos, um lapso maior de reabilitação do comportamento desde o cometimento da falta disciplinar.
Nas decisões de indeferimento dos pedidos em que o apenado tinha o conceito regular de comportamento, o Juízo limitou-se a mencionar que não cumpria o requisito subjetivo, enquanto nas decisões de deferimento com o mau comportamento, o Juízo explica a flexibilização como medida excepcional a ser adotada, por exemplo:
Contudo, verifica-se na certidão carcerária em questão que o apenado não praticou nenhum fato novo desde 04/07/2019 - data da sua última prisão; e diante da Pandemia de COVID 19 e da Recomendação do CNJ nº 062 de 17/03/2020, não vejo nenhum obstáculo à concessão do benefício ao reeducando (GOIÁS, 2020, p. 4).
Quanto à representação legal, observa-se que 250 dos pedidos são feitos pela Defensoria Pública e 226 por advogados, posto que o resultado da proporção entre os deferimentos foi diferente do que apontou os pedidos de prisão domiciliar. A Defensoria Pública obteve importante êxito nos deferimentos, em especial nos deferimentos antecipados:
Gráfico 13: Provimento por defesa nos pedidos de Livramento Condicional e Progressão
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados coletados (2020).
Conforme o painel sobre inspeções penais em especificações prisionais, do Conselho Nacional de Justiça, a Penitenciária Coronel Odenir Guimarães (POG), destinada ao cumprimento de pena definitiva por pessoas do gênero masculino, nos meses de abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro e novembro de 2020, tinha, respectivamente, 2.345, 2.250, 2.218, 2.255, 2.255, 2.255, 2.273 e 2.278 pessoas presas (BRASIL, CNJ, 2020a). Vale apontar que o mesmo relatório indica que a POG ostenta péssimas condições, encontrando-se nos meses de abril até dezembro de 2020 com taxa de lotação de 240%. São considerados para fins de classificação das condições os seguintes fatores: taxa de ocupação, sala de aula, sala de entrevista com advogado, oficinas de trabalho, local para visitação íntima e dos familiares, local adequado para assistência religiosa, gabinetes odontológicos, enfermaria, locais adequados para prática esportiva, detectores de metais e local para banho de sol.
Apesar do número de deferimentos da progressão de regime/livramento condicional ser maior que o número de prisões domiciliares, há de se considerar que os 23% de pedidos deferidos de forma antecipada observaram um lapso temporal para adimplemento dos requisitos objetivos de no máximo 3 (três) meses. Considerando as novas condenações, as novas prisões e as regressões para o regime fechado, não é possível afirmar que as decisões modificaram de forma significativa a superlotação das penitenciárias do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, afinal, se comparados os 119 pedidos deferidos antecipadamente com o número de pessoas presas na Penitenciária Coronel Odenir Guimarães até novembro de 2020, verifica-se que não há uma modificação real da realidade carcerária, permanecendo acima de 240% a taxa de ocupação em todos os meses (BRASIL, CNJ, 2020a, p. 2).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão do Poder Judiciário, em março de 2020, editou a Recomendação Nº 62/2020, que norteia os magistrados da execução penal a aplicarem medidas de desencarceramento, concedendo prisão domiciliar àqueles pertencentes ao grupo de risco à Covid-19, dentre outras medidas (BRASIL, CNJ, 2020c).
Apesar das violações massivas de direitos, o que caracteriza o sistema prisional brasileiro como um Estado Inconstitucional de Coisas, colocando em xeque a humanidade das pessoas encarceradas, observa-se uma enorme resistência do Poder Judiciário goiano em deferir pedidos de caráter coletivo que visassem o excarceramento.
A despeito das recomendações, as entidades nacionais e internacionais de Direitos Humanos alertaram que a única medida eficaz para contenção da propagação da Covid-19 nos estabelecimentos penais é o desencarceramento. Inclusive, o Conselho Nacional de Justiça, em seu último boletim quinzenal, demonstra que os óbitos no sistema carcerário brasileiro, entre maio de 2020 e maio de 2021, aumentaram em 7.850%, saltando de 734 para 57.619, o que aponta a necessidade de adoção de uma política criminal voltada para o desencarceramento (BRASIL, CNJ, 2021, p. 3).
A redução da população carcerária é apontada pelo Subcomitê de Prevenção à Tortura (SPT) como uma política necessária para prevenção à Covid-19, não apenas no sistema carcerário, mas também para o ambiente extramuros, uma vez que a contaminação massiva das pessoas encarceradas ajudaria, também, a disseminar o vírus, uma vez que o cárcere não é estático. A pauta do subcomitê para os mecanismos nacionais de prevenção à tortura aponta que o encarceramento deve ser a última medida, recomendando aos magistrados que adotem medidas alternativas à prisão, como prisões domiciliares, monitoração eletrônica, dentre outras medidas (SPT, 2020, p. 4).
Além do Subcomitê, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em 9 de abril de 2020, redigiu uma declaração chamada Covid-19 e direitos humanos: problemas e desafios devem ser abordados com uma perspectiva de direitos humanos e respeitando as obrigações internacionais, onde aponta como um dos principais desafios do enfrentamento à Covid-19 o combate à superlotação, considerando o alto impacto que a Covid-19 poderia ter sobre as pessoas encarceradas (CIDH, 2020).
A CIDH, ainda, em sua nota, chama os Estados para garantir a saúde e a integridade física das pessoas privadas de liberdade e suas famílias, diante da Covid-19, orientando o Poder Judiciário a avaliar, prioritariamente, a concessão de medidas alternativas, dando o exemplo do livramento condicional, da prisão domiciliar ou da progressão antecipada, em especial às pessoas pertencentes ao grupo de risco (CIDH, 2020).
O Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), em sua Nota Informativa Nº 5, incumbe aos Poderes Judiciário e Executivo a missão de implementação de políticas mitigadoras ao “estrago” da Covid-19 nas penitenciárias brasileiras, apontando que os principais eixos de mitigação da infecção pelo coronavírus são: o desencarceramento, o estabelecimento de canais e fluxos de denúncias e controle externo, o contato com o mundo exterior com as medidas sanitárias necessárias, a provisão de material de higiene e cuidados básicos e a garantia de acesso a tratamentos e cuidados com a saúde (MNPTC, 2020, p. 5).
Em que pesem as amplas recomendações de instituições nacionais e internacionais, constata-se no presente estudo que o Juízo responsável pela fiscalização do cumprimento de pena em regime fechado no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia deixou de adotar medidas desencarceradoras – que efetivamente tutelaram a população carcerária da contaminação em massa pela Covid-19. Em análise aos pedidos de prisão domiciliar, é possível vislumbrar traços interessantes de uma política omissa aos cuidados com a vida (logo, uma política de morte), uma vez que a quantidade de indeferimentos foi de 84%, de deferimentos foi apenas 10% (11 deferimentos) e 6% de casos em que ainda não havia decisão no momento da obtenção dos dados.
A análise demonstra ainda importantes traços da necropolítica na gestão das penitenciárias durante a Covid-19, por exemplo, o indeferimento de todos os casos em que os reeducandos portavam doença respiratória ou tuberculose (que, conforme mencionado, é uma doença com maior incidência nas pessoas negras e pobres), além da discrepância na proporção entre os deferimentos de pedidos realizados por advogados particulares e os pedidos realizados pela Defensoria Pública, o que demonstra uma discriminação injustificada com os chamados necessitados pela Lei Complementar 80/1994 (BRASIL, 1994).
Além dos pedidos de prisão domiciliar, resultado semelhante foi obtido em análise aos pedidos de antecipação de progressão de regime/livramento condicional. Apesar do “êxito” ser maior nesses pedidos, constata-se que, apesar do objeto dos pedidos ser a antecipação, o momento de deferimento foi após o adimplemento do requisito objetivo, momento em que os apenados já sairiam do cárcere. Outrossim, mesmo os pedidos que foram deferidos antecipadamente, em sua maioria foram antecipados em até 3 meses, o que não alterou significativamente o número de pessoas encarceradas. Afinal, pelo Painel de dados sobre as inspeções penais em especificações prisionais do CNJ, é possível verificar que, na Penitenciária Coronel Odenir Guimarães (responsável por custodiar as pessoas do gênero masculino em cumprimento de pena), a taxa de ocupação nunca foi menor que 240% entre os meses de março a novembro de 2020, sendo reduzida devido à transferência dos apenados dada a reforma na unidade prisional.
Mbembe aponta que os alvos da necropolítica são desumanizados, marginalizados e constantemente torturados, mesmo que de formas sutis (MBEMBE, 2018, p. 38), perdendo o estatuto político e os direitos sobre o próprio corpo. O cárcere, por sua vez, é um ambiente que nega a humanidade das pessoas, privando-as dos direitos fundamentais mais básicos e as submetendo a situações extremas de insalubridade e privações.
A necropolítica, segundo Mbembe, faz-se presente em um modelo de soberania em que ser soberano é ter controle sobre a mortalidade e a vida como a implantação e a manifestação de poder (MBEMBE, 2018, p. 4). Essa forma de gestão é voltada para a produção da morte em massa daqueles que são tomados como descartáveis, inimigos, indesejáveis, e se expressa, necessariamente, na concatenação de biopoder, estado de exceção e estado de sítio.
Os conceitos de estado de exceção e estado de sítio são explorados por Giorgio Agamben, segundo o qual o totalitarismo moderno é traduzido pelo estado de exceção, uma guerra civil juridicamente possível e permanente que tem por finalidade a eliminação de categorias inteiras de cidadãos que não se integram ao sistema político ou são identificados como inimigos políticos (AGAMBEN, 2004, p. 13).
No entanto, adota-se neste trabalho a concepção de Estado Suicidário, conceituado pelo professor Vladimir Safatle como um estado predador que, diante de uma crise generalizada, abandona absolutamente sua natureza protetora e se constitui a partir do discurso de “deixar morrer”, ou seja, da indiferença em relação à morte em massa, sendo o ator contínuo da catástrofe, agindo contra sua própria existência enquanto Estado soberano e a existência de seus cidadãos. Safatle (2020) sustenta que o Estado Suicidário está associado à necropolítica e depende dela para “gestão” da crise e produção da destrutividade.
O controle da vida e a produção da morte em massa (biológica ou existencial) nos Estados contemporâneos perpassa fundamentalmente pelo cárcere, concentrando ali um grande número de indesejáveis e descartáveis, negando-lhes a humanidade. No contexto pandêmico isso é acentuado, afinal, num ambiente com condições insalubres, de aglomerações intermitentes, de epidemias de doenças controladas há anos, a propagação da Covid-19 é muito mais “exitosa” e gera resultados catastróficos.
Dessa forma, a não adoção de uma política criminal séria voltada ao desencarceramento reflete a necropolítica enquanto forma de gestão da vida dos brasileiros pobres, que têm suas vidas emparedadas e, dentro das paredes do cárcere, são expostos a toda sorte de privações e torturas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ALMEIDA, C. DPE-GO protocola ação civil pública para que o Estado adote medidas para conter a propagação da Covid-19 no sistema prisional. Defensoria Pública do Estado de Goiás, Notícias, 19 jun. 2020. Disponível em: http://www.defensoria.go.def.br/depego/index.php?option=com_content&view=article&id=2049:dpe-go-protocola-acao-civil-publica-para-que-estado-adote-medidas-para-conter-a-propagacao-da-covid-19-no-sistema-prisional&catid=8&Itemid=180. Acesso em: 3 mar. 2021.
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↩︎Segundo Giorgio Agamben (1942), o Estado de Exceção apresenta-se como uma abertura de uma lacuna fictícia no ordenamento jurídico, com o objetivo de proteger a existência da norma e sua aplicabilidade. Exploraremos a seguir o estado de exceção como regra, nos dias atuais, e o conceito de Estado Suicidário.
Disponível em: https://seeu.pje.jus.br/seeu/. Acesso em: 5 jan. 2020.↩︎
O trabalho citado traz a quantidade de vagas existentes em todo o Sistema Prisional Goiano, bem como a taxa de ocupação de cada penitenciária do Estado. Dessa forma, realizou-se a soma de todas as taxas de ocupação, que foi dividida pelo número de penitenciárias, para se chegar até a média geral que o trabalho não traz.↩︎