Bandido bom é bandido que ninguém vê

massificação do cárcere em Alagoas e a “cegueira” social insculpida pelo modelo neoliberal

Autores

DOI:

https://doi.org/10.31060/rbsp.2023.v17.n2.1542

Palavras-chave:

Encarceramento em massa, Neoliberalismo, Pobreza, Estado Penal, Dignidade humana

Resumo

Por muito tempo, a prisão foi meio para a aplicação da punição estatal, e não a punição em si mesma. A mudança de perspectiva sobre a prisão, sobretudo com a disseminação dos ideais democráticos, acabou sendo impulsionada pelo argumento de que, para além de punir, seria preciso recuperar e reinserir o transgressor de maneira útil na sociedade, consolidando-se o que se revelou ser uma importante estratégia política de segregação social, extremada pelo modelo neoliberal, que massifica o cárcere para determinados grupos politicamente não representativos, ampliando-se as desigualdades sociais. No presente artigo, portanto, é dessa dinâmica entre as aspirações do modelo econômico e a alegada utilidade social do cárcere que trataremos, cujo objetivo principal será o de desvelar e analisar criticamente como se dá este ciclo correlacionado de segregação social – desemprego – criminalidade – punição – encarceramento em massa. Nesse sentido, para que se possa alcançar tal objetivo, utilizamos a metodologia hipotético-dedutiva, de base majoritariamente qualitativa, com a articulação da técnica da revisão bibliográfica e da consequente coleta de dados na literatura pertinente e nas bases oficiais sobre o cárcere brasileiro mantidas por veículos oficiais de controle e de punição. Conquanto, para que tal pudesse ocorrer da maneira menos complexa e generalista possível, optamos por ilustrar algumas das reflexões apresentadas com os dados a respeito do estado de Alagoas (um dos mais pobres do Brasil), quer seja por ser o lugar de onde falamos, quer seja por seus indicadores revelarem da maneira mais clara e direta aquilo problematizado.

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Biografia do Autor

Bruno Cavalcante Leitão Santos, Centro Universitário Cesmac

Doutor em Direito pela PUCRS. Mestre em Direito Público pela UFAL. Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela UCDB. Professor de Direito Penal no Centro Universitário CESMAC – Maceió/AL. Líder do Grupo de Pesquisa "Sistema Penal, Democracia e Direitos Humanos". Advogado.

Francisco de Assis de França Júnior, Centro Universitário Cesmac

Doutorando e Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Portugal. Pós-graduado em Psicologia Jurídica e em Ciências Penais. Professor de Direito Penal e Criminologia no Centro Universitário CESMAC – Maceió/AL. Líder do Grupo de Pesquisa "Sistema Penal, Democracia e Direitos Humanos". Advogado.

Thais Sarmento Cardoso Wedekin, Centro Universitário Cesmac

Pós-Graduanda em Criminologia pelo Centro Universitário Cesmac. Graduanda em Direito pelo Centro Universitário Cesmac. Graduada em Jornalismo pela Ufal. Jornalista.

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Publicado

01-08-2023

Como Citar

CAVALCANTE LEITÃO SANTOS, Bruno; DE FRANÇA JÚNIOR, Francisco de Assis; SARMENTO CARDOSO WEDEKIN, Thais. Bandido bom é bandido que ninguém vê: massificação do cárcere em Alagoas e a “cegueira” social insculpida pelo modelo neoliberal. Revista Brasileira de Segurança Pública, [S. l.], v. 17, n. 2, p. 60–83, 2023. DOI: 10.31060/rbsp.2023.v17.n2.1542. Disponível em: https://revista.forumseguranca.org.br/rbsp/article/view/1542. Acesso em: 23 nov. 2024.